9 de março de 2018

Aperta-se o cerco à Sky e Froome está a tornar-se no indesejável

Presença de Froome no Tirreno-Adriatico não agrada a todos
(Fotografia: Facebook Tirreno-Adriatico)
A paciência está no limite para os organizadores, ciclistas, directores de equipas... Ver Chris Froome a competir está a provocar um mal-estar que começa a não ser possível esconder. Pede-se celeridade na resolução do processo do uso da substância salbutamol - o único pormenor em que todos, inclusivamente Froome e Sky, estão de acordo -, mas é pouco provável que venha a acontecer. Para agravar a situação da equipa britânica, o relatório divulgado no Reino Unido que levantou suspeitas sobre Bradley Wiggins e possivelmente outros ciclistas no Tour de 2012, faz com que a Sky esteja a ser atacada praticamente por todos os lados. Independentemente do que venha a acontecer, estes casos que envolvem a Sky podem levar a uma mudança nos regulamentos.

O presidente da UCI, David Lappartient está a ser pressionado para passar das palavras à acção. Na sequência do relatório divulgado pelo comité do departamento digital, cultural, media e desporto no Reino Unido (ver link no final do texto), o dirigente quer que o organismo inicie uma investigação à Sky, pois considera que se foram utilizadas substâncias para melhorar a performance e não para problemas de saúde, como foi defendido pela equipa que recorreu ao uso de excepção terapêutico, então "é batota", nas palavras de Lappartient, em entrevista à BBC.

O responsável considera que chegou o momento de se terminar com as "zonas cinzentas", levantando também dúvidas sobre as declarações de um antigo director da Sky, Shane Sutton, "Penso que temos de saber mais sobre estas histórias, ainda existem zonas cinzentas, mesmo no relatório. E vi que o Shane Sutton pediu ao Wiggins para dizer a verdade. O que é que isso significa?" Para Lappartient, o relatório deixa transparecer que o que terá acontecido foi "organizado" e não um "deslize". "Pode afectar e credibilidade do desporto e é por isso que estou preocupado com isto", afirmou o presidente da UCI.

Sobre Chris Froome, Lappartient já tinha expressado a opinião que o ciclista não deveria estar a competir. Porém, as regras permitem que o faça. O dirigente deseja que o caso esteja fechado antes do Tour, dizendo mesmo que seria catastrófico para a modalidade que a Froome competisse e eventualmente visse depois os resultados serem anulados, se a sua defesa não resultar. Mauro Vegni, responsável pelo Giro, não queria ver acontecer com Froome o que se passou com Alberto Contador em 2011. O espanhol ganhou, mas ao perder o processo sobre o uso de uma substância proibida, acabou por ficar sem a vitória. Porém, o discurso de Lappartient deixa antever que será impossível o processo de Froome estar concluído antes de 4 de Maio, dia em que arranca a Volta a Itália.

E também não parece convencido que estará fechado a 7 de Julho, no início do Tour. Se assim for, o presidente da UCI espera que Froome aceite a proposta de não competir na Volta a França. "Para ele estar mais concentrado em defender o seu caso, do meu ponto de vista, seria melhor ele não correr", afirmou. Aqui também começa a ficar em causa o ambiente hostil, por parte dos adeptos, que poderá estar à espera do ciclista e da Sky, como já aconteceu há uns anos.

Froome, o indesejável

O ciclista britânico respondeu às declarações de Lappartient, dizendo que faria melhor em dizê-lo pessoalmente e não através dos meios de comunicação social. Froome refugia-se nas regras que lhe permitem competir e reitera: "Obviamente que estou a fazer o que posso para resolver isto o mais rapidamente possível." Também repete que o caso não era suposto ser público.

Chris Froome está actualmente a competir no Tirreno-Adriatico, tendo em vista a preparação para a Volta a Itália, depois de ter sido 10º na Ruta del Sol. Em Itália está também um Romain Bardet (AG2R) que foi dos primeiros a apelar a Froome que se auto-suspendesse e agora foi Tom Dumoulin (Sunweb) que afirmou que se fosse ele, não estaria a competir e não apenas pelo facto da sua equipa pertencer ao Movimento Por um Ciclismo Credível (MPCC) - a Sky não faz parte. "[Froome] não quebrou nenhuma regra. Pode estar aqui? Pode. É bom para o ciclismo? Não. Traz algum benefício? Não", afirmou o holandês.

Froome está mesmo a tornar-se num indesejável. Vegni considerou uma grande vitória ter o britânico no Giro, agora já só quer evitar passar novamente pela situação de ter de retirar uma possível vitória a um ciclista, como aconteceu a Contador, tendo Michele Scarponi sido declarado o vencedor. Christian Prudhomme, director do Tour, considera grotesco que ainda não se tenha chegado a uma conclusão. "Queremos uma resposta. Precisamos de uma resposta, não apenas para nós na Volta a França, mas para todos os organizadores, para que não haja um ciclista que mais tarde se diga que não deveria ter estado na partida. É de loucos. É completamente grotesco! Precisamos de uma resposta", salientou à RMC Sport.

Quanto ao MPCC, é feita nova insistência para que Froome não esteja em competição e o movimento deseja que os organizadores possam excluir ciclistas que estejam na situação do britânico. O único problema é que tal iria contra os actuais regulamentos, que o MPCC quer ver mudados. "O MPCC pede à UCI que altere a suas regras no World Tour para que os organizadores possam excluir das suas corridas quem tenha uma investigação pendente após um controlo positivo num resultado adverso", lê-se num comunicado.

De recordar que Froome acusou o dobro do permitido de salbutamol durante a Vuelta, uma substância utilizada por asmáticos. O caso não era suposto ser revelado publicamente, mas foi publicado em dois jornais.

O calendário do ciclista vai sendo anunciado à medida que as corridas se vão aproximando, estando apenas confirmado o que já se conhecia antes da polémica rebentar: Froome quer atacar Giro e Tour.

Todos querem o lugar de Froome

O seu caso e a sua presença nas corridas acaba por desviar as atenções desportivas para as suspeitas crescentes sobre a Sky. Questiona-se o futuro da equipa, mas a curto prazo as dúvidas são também sobre o ambiente dentro da equipa. Geraint Thomas, por exemplo, nem quer ouvir falar de corticóides e do uso de excepção terapêutico. Certo é que há quem queira ficar com o lugar de líder de Froome, se o posto vier a ficar livre. Thomas foi o primeiro a avisar que iria ao Tour a pensar na sua corrida e não apenas para ajudar o colega. O galês não ficou nada satisfeito por ver Froome ir ao Giro e ao Tour, quando Thomas pensava que teria pelo menos a oportunidade de ser novamente líder em Itália. E a Vuelta, não o deixa satisfeito. Está em final de contrato e não seria surpreendente vê-lo seguir as pisadas de Richie Porte e procurar uma equipa que lhe desse estatuto de número um.

Michal Kwiatkowski também já chegou a dizer que gostaria de ter mais destaque numa grande volta. Sendo quatro anos mais novo que Thomas - tem 27 -, ainda vai muito a tempo de ter a sua oportunidade e talvez por isso tenha mudado o discurso para: "Quero ganhar todas as clássicas." E a julgar pela exibição na Volta ao Algarve, uma corridas de uma semana também serão objectivo.

Wout Poels (30) - que sofreu esta sexta-feira uma grave queda no Paris-Nice - é outro que já pediu papel de líder numa grande volta, mas não estava na equação, ainda mais quando Mikel Landa pertencia à Sky. O espanhol saiu, mas holandês poderia aspirar no máximo a corridas por etapas mais curtas. Agora já disse publicamente que quer assumir a responsabilidade de Froome, caso este seja sancionado. David de la Cruz acabou de chegar à Sky e estará no Giro como gregário, mas foi peremptório em dizer que lhe foi prometido que na Vuelta teria a sua oportunidade.

Até que ponto é que as suspeitas sobre Bradley Wiggins e o comportamento na equipa no ano em que ganharam o primeiro Tour, mais o caso do "pacote suspeito" que envolve também Wiggins e agora a situação de Chris Froome, estão a destruir um alicerce essencial da equipa: a união em torno de um líder, aconteça ou que acontecer? Evitar o desmoronar interior da Sky é desde logo uma missão que estará a decorrer.

Mais do que palavras a falar de mudanças, todo este mal-estar é a prova que é preciso agir e rápido, mesmo que já não se vá a tempo de ser rápido na resolução de pelo menos do caso de Chris Froome.

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