8 de fevereiro de 2018

A geração de ouro da Colômbia já tem a sua corrida e só pensa em conquistar as três grandes em 2018

Nairo Quintana é actualmente "apenas" uma das muitas figuras colombianas
(Fotografia: Giro d'Italia)
Mais do que a geração de ouro, pode-se cada vez mais falar de um país de ouro no ciclismo. O talento colombiano sempre foi reconhecido. Porém, o século XXI assistiu a uma explosão de qualidade que tem visto as portas serem constantemente abertas do World Tour. A Colômbia tornou-se num autêntico berço de grandes ciclistas. E já nem é só de trepadores, Fernando Gaviria mostrou que o potencial é transversal aos vários estilos. É sprinter, mas já pensa em monumentos. Porém, para os adeptos verem as suas principais figuras no país, quanto muito alguns apareciam nos Nacionais. A Volta à Colômbia é corrida para aqueles que sonham com a chegada a outro nível, longe dos tempos em que os principais nomes do país a viam como prova a não perder. Contudo, agora a Colombia Oro y Paz, não só conseguiu a classificação 2.1, como a colocação numa fase inicial do calendário deixa os seus organizadores a sonhar que nos próximos anos as estrelas presentes sejam muito além dos colombianos.

É preciso recuar aos anos 80 para que ter uma Colômbia na rota de algumas das referências da modalidade. A Clásico RCN contou com Bernard Hinault, Greg Lemond, Laurent Fignon, por exemplo. No entanto, o país saiu da rota de ciclistas deste estatuto, mas o ciclismo nunca deixou de ser um desporto amado na Colômbia. Sempre houve a tentativa de ir levando equipas até à Europa, mas foi quando em 2008 surgiu a Team Colombia - como é mais conhecida, apesar de ter começado como Colombia Es Pasion-Coldeportes - que se deram os passos mais firmes rumo ao actual estado da modalidade.

Senão veja-se: Nairo Quintana (Movistar), Jarlinson Pantano (Trek-Segafredo), Sergio Henao (Sky), Johan Esteban Chaves (Mitchelton-Scott) e John Darwin Atapuma (UAE Team Emirates) passaram pela Team Colombia. A qualidade da equipa era tal, que até se pode dizer que teve promessas que acabaram por não se cumprir, caso de Fabio Duarte, actual colega de Ricardo Vilela na Manzana Postobón. A Team Colombia não era conhecida por ser um conjunto forte, mas sim por ter excelentes individualidades, que a cada corrida em que participavam, animavam e muito.

Era esse o objectivo. Mostrar o talento e o potencial dessas individualidades. A oportunidade foi mais do que aproveitada por quem lá passou. Quintana e Chaves destacaram-se muito cedo ao vencerem o Tour de l'Avenir (Volta a França do Futuro), mas era claro que havia muito por onde escolher pelas equipas do World Tour. Esses jovens ciclistas amadureceram. Nairo Quintana já conta com um Giro e uma Vuelta, enquanto Chaves e Rigoberto Uran sabem o que é subir ao pódio de uma grande volta. Falta o Tour e ao olhar para a lista de colombianos que podem muito bem lutar pelas corridas de três semanas, na Colômbia vai-se viver um ano intenso. É que há ciclistas que podem ganhar Giro, Tour e Vuelta além de um Gaviria que promete ir a França consolidar o seu estatuto de sprinter mundial, ainda que antes vá mostrar que também poderá ser um homem de clássicas (novo rival de Peter Sagan?)

Começando pelo Giro. Um problema no joelho estragou praticamente toda a temporada de Johan Esteban Chaves (28 anos) em 2017. Foi ganhando forma no final da época e arrancou 2018 já com a conquista da Herald Sun Tour. Pode não ser a corrida mais importante, mas é perfeita para dar a motivação que eventualmente poderia precisar. Mais do que motivação, dar-lhe-á a confiança que sofreu um golpe perante o problema físico do ano passado. Chaves é um trepador nato e em 2016 a vitória parecia estar ali tão perto, mas Nibali estragou a festa colombiana no Giro. O contra-relógio é o seu problema, mas estando em forma, pode muito bem conseguir fazer diferenças importantes na montanha.

História idêntica tem Miguel Ángel López (24). O Superman partiu uma perna no final de 2016 e lá se foi grande parte de 2017. Porém, chegou bem à Vuelta e apareceu aquele entusiasmante ciclista, que ganhou duas etapas e que com a saída de Fabio Aru ganhou o lugar de líder para as grandes voltas. Que ninguém se deixe enganar pela juventude. A falta de experiência poderá ser um handicap, mas é tacticamente inteligente e capaz de medir forças com os principais candidatos.

Sergio Henao, bicampeão colombiano de estrada (30 anos), ficará sempre preso à função de gregário, seja Chris Froome ou outro o líder, caso o britânico sofra uma sanção que o afasta do Giro. O mesmo acontecerá caso Sebastián Henao seja escolhido. Já Carlos Betancur recuperou a alegria de competir. Tanta expectativa que acabou com a AG2R a nem saber onde andava o seu ciclista! Em Agosto de 2015 o contrato foi interrompido. A Movistar acreditou que ainda poderia salvar Betancur e no ano passado, o colombiano finalmente reapareceu mais perto do seu real valor. E até ficou a sensação que o melhor ainda está para vir, apesar de ter acabado a Vuelta com uma queda brutal. Tem apenas 28 anos e vai muito a tempo de se confirmar como grande voltista. A confiança é total, pois até já deixou o aviso que não quer ficar na sombra do trio maravilha da Movistar: Quintana, Mikel Landa e Alejandro Valverde. O Giro poderá ser a sua oportunidade.

Para a Volta a França teremos um Nairo Quintana 100% focado no sueño amarillo. Só lhe falta o Tour, mas também falta sempre algo a este colombiano que simplesmente não encontra o antídoto para bater Chris Froome. 2017 foi para esquecer, com a aposta no Giro a custar caro fisicamente quando chegou a França. Em 2018 poderá enfrentar uma concorrência na equipa que pensava que tinha terminado com Valverde lhe abriu o caminho da liderança no Tour. Mikel Landa não quer ser mais gregário e foi para ser o número um que assinou pela Movistar.

Rigoberto Uran (EF Education First-Drapac powered by Cannondale) era daqueles ciclistas em que já não se acreditava, mas foi já na casa dos 30 que atingiu a maturidade e aquela performance em 2017 foi brilhante. Podem acusá-lo de jogar à defesa, de não dar espectáculo, mas para a história fica a vitória de etapa e o segundo lugar na geral. E mais: fica uma confiança tremenda de quem mais do que nunca acredita que pode dar aquele passo que lhe falta, já que soma também dois segundos lugares no Giro. Depois do que fez no ano passado, mesmo sem ter uma equipa muito forte, estará entre os candidatos. Restam Atapuma e Pantano, dois ciclistas à procura de etapas e talvez de uma classificação da montanha.

Na Vuelta haverá Lopez, Chaves e Uran, para já, além de um Jhonatan Restrepo.  23 anos de muito talento, pronto a começar a render. A Katusha-Alpecin vai apostar forte no seu jovem colombiano, ainda que na Vuelta seja possível que procure mais etapas, pois ainda está numa fase de evolução no que diz respeito a grandes voltas. Mas cuidado com ele nas clássicas e em corridas de uma semana.

Para acabar o ano haverá uns Mundiais em Innsbruck, na Áustria, que serão muito propícios a ciclistas com características como Chaves, López, Uran...

A Team Colombia deixou um vazio quando acabou em 2015, mas surgiu a Manzana Postobón, que em 2017 subiu ao escalão Profissional Continental. Juan Felipe Osorio (23 anos) é já um nome a ter em atenção (venceu a classificação da montanha na Volta ao Algarve), tal como Aldemar Reyes (22) e Juan Sebastian Molano (23), um sprinter que ganhou duas etapas na Volta ao Alentejo. Julián Cardona (21) foi "apanhado" pela EF Education First-Drapac powered by Cannondale e Álvaro José Hodeg (21) pela Quick-Step Floors.

No entanto, há um nome que ainda agora chegou ao World Tour e já é falado até à exaustão: Egan Bernal. 21 anos apenas e um dos ciclistas que ainda nem se percebe bem tudo o que pode dar, pois pode dar tudo. Evoluiu na Androni-Sidermec-Bottechia e a Sky foi buscar uma pérola, que mal se estreou, ganhou logo a juventude no Tour Down Under, sagrando-se também campeão nacional de contra-relógio.

Este texto começou por causa da Oro e Paz, corrida que viu Fernando Gaviria ganhar as três primeiras etapas. Nela estão quase todas as principais figuras colombianas - algo que nem os Nacionais às vezes conseguem juntar - e os trepadores vão entrar em acção nos últimos três dias. Até Nairo Quintana lá quis começar a época, tendo sofrido uma queda, mas sem gravidade. O ciclista, que tem sido um dos mentores de uma equipa que tanto apoia jovens corredores na sua terra, Boyacá, desabafou antes da competição que há muito que não corria no seu país.

Para a federação colombiana, que está na organização, foi uma vitória ter uma corrida que chamou o "seus" ciclistas. Mas porquê ficar por aí? O discurso já é de em 2019 convencer Tom Dumoulin, Fabio Aru, Vincenzo Nibali, Chris Froome... Nesta edição, Julian Alaphilippe (Quick-Step Floors) e Jonathan Castroviejo (Sky) são as principais figuras estrangeiras e o francês está com ideias de sair da Colômbia com mais uma conquista e intrometer-se na festa colombiana.

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