7 de outubro de 2017

Qual é o lugar de Nibali na história?

(Fotografia: Facebook Il Lombardia)
Esta foi uma pergunta muito feita a Chris Froome depois do britânico ter vencido a Vuelta. Pode-se também fazer a Vincenzo Nibali. O italiano é uma espécie de mal-amado no ciclismo, mas quando se olha para o currículo, tem um que o coloca entre a elite. Mas então porque razão é tão menosprezado? Nibali venceu a três grandes voltas e este sábado somou o seu segundo monumento, ao vencer novamente na Lombardia. Foi também a sua 50ª vitória na carreira. Aos 32 anos, Nibali pode parecer não ter nada a provar. Ainda assim falta algo aos olhos de muitos.

O italiano não se consegue livrar da fama de vencer quando não estão presentes os principais candidatos. Este é o factor que assombra a sua conquista da Volta a França em 2014, por exemplo, e também a Vuelta em 2010. Mas é principalmente o Tour que ficou na memória. Nesse ano esperava-se uma grande luta entre Chris Froome, então à procura da segunda vitória consecutiva, e um em forma Alberto Contador. Ambos acabaram por abandonar devido a quedas e Nibali aproveitou a passadeira estendida. Conquistou o Tour com mais de sete minutos de vantagem para Jean-Christophe Peraud e mais de oito para Thibaut Pinot. Um pódio do mais inesperado dos últimos anos.

Se Froome estivesse... Se Contador não tivesse caído numa descida... De "ses" não se faz a realidade. Se não fosse Nibali, outro teria aproveitado a oportunidade para vencer aquela que continua a ser vista como a mais importante corrida de três semanas. Pode ser complicado dar-lhe o mérito, mas Nibali teve todo o mérito na forma como conquistou esse Tour.

Hoje, na Lombardia foi perfeito, ou quase. Era desnecessário aquele ataque quando Pinot tinha acabado de agarrar um bidão. São estes pequenos pormenores que não ajudam a Nibali ganhar um maior respeito. Será sempre lembrado por se ter agarrado ao carro na Vuelta de 2015 para recuperar o lugar no grupo da frente, depois de ter ficado num corte do pelotão. Foi um acto de tão baixo nível, que ainda hoje se fala de um gesto à Nibali, sempre que um ciclista repete a batota.

Mas voltando à Lombardia deste sábado. A Bahrain-Merida teve das melhores exibições do ano em corridas do World Tour. Era claro que iria ser todos contra Nibali. Foi Thibaut Pinot quem mexeu com a corrida perto do final. Nibali esperou pelo momento certo para ir buscar o francês e na descida já se sabe, o italiano é dos melhores do mundo. Isso ninguém nega. Pinot está muito mais ágil a descer, mas nunca há-de chegar ao nível de Nibali. Perdeu assim a Lombardia. Ou melhor, assim ganhou o italiano a Lombardia. Faça-se justiça. Foi uma exibição de enorme nível frente a um pelotão de luxo (que pena Tom Dumoulin ter falhado à última hora devido a doença, pois certamente que teria ajudado ao espectáculo).

Olhando para os números, Nibali teve um ano sensacional. Olhando para os números, Nibali tem de figurar entre os melhores da história. Mas os números nem sempre contam tudo. Recuando ao Giro. O italiano foi terceiro a apenas 40 segundos de Tom Dumoulin. Porém, esperava-se mais. Nunca foi um Nibali realmente candidato a conquistar o seu terceiro Giro. Em 2016 proporcionou uma reviravolta fantástica na corrida, quando parecia que estava prestes a ir para casa, recuperou física e psicologicamente para vencer... com uma ajuda da queda Steven Kruijswijk (lá está, sempre algo que parece minimizar o mérito).

No entanto, este ano esteve muito defensivo, parecia simplesmente intimidado por a corrida ter Nairo Quintana e depois por Tom Dumoulin ter aparecido simplesmente grandioso. As curtas diferenças devem-se mais à necessidade do holandês de ter de melhorar na alta montanha do que propriamente por Nibali ter alguma vez assustado Dumoulin. Venceu uma etapa, foi ao pódio, mas não foi o ciclista que se esperaria, principalmente para quem colocou a Volta a Itália como objectivo e não o Tour.

Na Vuelta ficou a 2:15 de Chris Froome. Acabou por ser ele quem mais parecia que poderia ser o adversário do britânico. Froome não teve uma vitória cantada, mas Nibali tanto aparecia a tentar mostrar-se como cada vez que surgia uma subida mais complicada, o italiano teve tendência a fraquejar. Foi difícil vê-lo como verdadeira ameaça.

Quando daqui a uns anos, já com Nibali, Froome e as actuais estrelas a verem as corridas fora das bicicletas, os números vão colocar o italiano como uma referência, principalmente do ciclismo transalpino. Mas falta uma grande vitória frente aos principais nomes, um triunfo que vá além dos números. E terá de ser no Tour. Para o ano irá, tudo indica, à Volta a França. Poderá ser o tudo ou nada para que deixe de ser falado como o ciclista que só ganha quando a concorrência não é tão forte.

Talvez esteja destinado a ser o mal-amado até ao fim, ainda que em Itália seja admirado. É além fronteiras que não gera muito apreço. Também não parece muito incomodado. É um ciclista de personalidade forte, que gosta de fazer tudo à sua maneira, independentemente do que pensam dele. Foi por isso que aceitou de bom grado um projecto como o da Bahrain-Merida. Assim passou  a ter mais do que uma palavra a dizer. Nibali sabe que já tem o seu lugar na história mais do que garantido, goste-se ou não se goste, mas até ele quererá o tal triunfo para história que não seja apenas mais um número.



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