5 de junho de 2017

A Sky já não é aquela equipa em que todos querem estar

A Sky tomou o ciclismo de assalto tornando-se rapidamente uma referência na modalidade, tanto pelos resultados, como pelos métodos de treino. Porém, se o seu poderio desportivo e financeiro são um atractivo para muitos ciclistas, a equipa britânica já não é aquela em que todos querem estar e começam a somar-se os casos de corredores que preferem sair. De certa forma é a Sky a pagar o preço de tentar ter sempre os melhores, mas depois não ter espaço para que todos possam cumprir as suas ambições pessoais.

Quando Mark Cavendish bateu com a porta no final de 2012, ninguém achou estranho. Afinal estranho era ver um dos melhores sprinters da história a ir buscar água e comida para Bradley Wiggins. Sem o comboio que estava habituado a ter, o britânico preferiu ir para outra formação e perante a sua importância no pelotão, ninguém na Sky lhe tentou fechar a porta. Parecia ser caso único quando se fala de ciclistas importantes dentro da estrutura de uma equipa, que se habituou a ser ela a escolher quem fica, quem sai e quem entra. Wiggins acabaria por sair, mas já com uma postura de final de carreira.

Foi Richie Porte quem abriu um precedente que agora poderá começar a tornar-se num problema para os responsáveis da Sky. O australiano foi o braço direito de Chris Froome e durante três anos transformou-se num gregário de luxo. Mas era notório que tinha qualidade para algo mais e a Sky percebeu que tinha de lhe dar uma oportunidade. Deixou-o ser líder num Giro (em 2015) em que tudo acabaria por correr francamente mal. Voltou ao seu papel principal, cumpriu-o, mas no final do ano não renovou contrato. Porte não queria ser apenas um ciclista de vitórias de corridas de uma semana e muito menos um gregário, queria uma equipa a ajudá-lo para atacar uma grande volta, nomeadamente a Volta a França. Há dois anos que está na BMC e é um dos adversários que Chris Froome já admitiu que terá de estar muito atento.

Nicholas Roche seguiu Porte este ano e depois de dois anos na Sky, o campeão irlandês de 32 anos admitiu que queria outra liberdade. Está disponível para trabalhar para os líderes, mas quer ter a oportunidade de lutar por uma ou outra vitória. A BMC aceitou essas condições.

A Sky aprendeu a lição com Richie Porte e quando viu que estava na mesma situação com Geraint Thomas, não só lhe deu a oportunidade de liderar no Giro (este ano), como escolheu ciclistas com o único objectivo de o ajudar, o que provocou outro problema com Elia Viviani, mas já lá vamos. A excepção era Mikel Landa, que seria oficialmente o co-líder, mas que na prática era o plano B. Mais uma vez as coisas não correram nada bem, desta feita por culpa de uma moto da polícia mal parada. Thomas abandonou e vai agora regressar também ele ao papel de gregário de Froome para o Tour, tal como aconteceu com Porte. Porém, em final de contrato, a Sky não quer perder mais um ciclista importante e sabe que o tem de manter satisfeito. Thomas disse que em 2018 estaria de volta ao Giro e a Sky estará disposta em dar-lhe novamente a liderança. A dúvida é se aos 31 anos Thomas não se importará de manter este duplo estatuto, ou se tal como Porte quer mais.

Já Mikel Landa (27 anos) não estará disposto a manter-se numa posição secundária. O espanhol chegou à Sky em grande. Era a aposta para a Volta a Itália e eventualmente para a Vuelta, se Froome não quisesse apostar na corrida. Porém, o Giro tem uma tendência a correr mal e em 2016 foi mais um caso. Landa abandonou com uma gastroenterite e a partir daí foi gradualmente perdendo a confiança das chefias da Sky. Este ano ficou também envolvido no mesmo incidente de Thomas, mas salvou o Giro com uma vitória de etapa e com a conquista da classificação da montanha. Mais do que nunca, Landa sente que merece ser líder. Jjá surgiram rumores que estará a negociar com a Astana o seu regresso à equipa cazaque e assim ter o papel de líder que a equipa não lhe deu e que o fez ir para a Sky e que na equipa britânica não conseguiu manter.

Wout Poels (29) pode transformar-se noutra dor de cabeça. O holandês já fez saber que quer tentar lutar por uma grande volta, mas com Thomas e Landa - e claro Chris Froome - na equipa tal não deverá acontecer. Poels teve um papel preponderante na vitória no Tour de Froome no ano passado e conquistou o primeiro monumento para a Sky na Liège-Bastogne-Liège. Este ano tem enfrentado problemas físicos, pelo que só conta com dez dias de corrida. Poels tem contrato até 2019, o que dá garantias à formação britânica, no entanto, ter um ciclista insatisfeito pode tornar-se complicado de gerir e enfraquecer uma estrutura que aposta tudo na força do conjunto para assegurar o triunfo individual.

Nem Thomas, nem Landa, nem Poels divulgaram publicamente se querem sair, mantendo-se fiéis à equipa que está perto de começar o objectivo principal da sua existência: a Volta a França. No entanto, Elia Viviani pode estar a quebrar a suposta harmonia, claramente cada vez mais frágil. O italiano não ficou nada satisfeito por ter sido excluído do Giro100. Tentou ser o bom companheiro de equipa, deixando palavras de apoio a quem tinha sido escolhido, mas na Volta à Califórnia foi um ciclista sem alegria e sem convicção. Só soma uma vitória individual em 2017, numa etapa da Volta à Romandia, num sprint em que até Froome ajudou a preparar. No passado domingo, o italiano ajudou a Sky a vencer a primeira edição da Hammer Series.

Viviani foi escolhido pela equipa britânica em 2015 por ser um sprinter que não precisa de um comboio para estar na luta por uma vitória e porque apresentava um currículo interessante de triunfos na Liquigas, que depois passaria a ser a Cannondale. Sprinter de qualidade, mas não com o estatuto de quem fizesse exigências para assinar pela Sky. Viviani sabia que ao aceitar a proposta estaria muito sozinho nos sprints, mas sempre encarou isso como um desafio. Agora parece que se fartou de ser uma aposta secundária e a exclusão do Giro terá sido o golpe final na paciência de Viviani.

Segundo a Gazzetta dello Sport, o italiano ter-se-á reunido com Dave Brailsford - o homem forte da Sky - para demonstrar o seu descontentamento e pedir mais oportunidades em corridas importantes. "Pedir" é capaz de ser uma palavra simpática. Viviani esteve com Brailsford em Piancavallo, horas depois de Landa vencer a etapa no Giro naquele local. Segundo o jornal italiano, Viviani quererá estar na Volta a Espanha, algo que será difícil de concretizar se Froome resolver tentar lutar por esta corrida além do Tour, o que é o mais provável em condições normais.

A Sky estará disposta em apostar em Viviani em algumas corridas de um dia, mas o jornal transalpino escreve que o ciclista de 28 anos estará a ponderar deixar a equipa já no final deste ano, apesar de ter contrato até 2018. Não se sabe qual será a posição da Sky se for o caso, mas com Viviani a não ter o papel mais preponderante na estrutura e com as vitórias a serem bastantes reduzidas, é provável que a porta até seja aberta para o italiano procurar outro caminho.

Uma equipa tão dominadora que vai, para já, sobrevivendo às suspeições que muito se tem falado sobre o pacote mistério dos tempos de Bradley Wiggins, é sempre apetecível para os ciclistas, ainda mais quando tem estado na vanguarda da evolução no método de trabalho e também da forma de competir. Porém, é também uma das equipas com uma hierarquia não só definida, mas em nada flexível, o que acaba por desiludir aqueles que procuram a glória pessoal, mas que têm de ser constantemente os homens de trabalho, os homens de sacrifício.


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