23 de abril de 2017

Valverde e a quarta vitória na Liège-Bastogne-Liège: "Para ti, amigo Scarponi"

(Fotografia: Facebook Liège-Bastogne-Liège)
A exibição foi fenomenal, como Alejandro Valverde tem repetido este ano em quase todas as corridas em que participa. Porém, a maior emoção foi quando o espanhol quis dedicar a vitória ao amigo Scarponi e as lágrimas tomaram conta do momento. "Quero dedicar esta vitória ao Michele Scarponi e a toda a sua família. Era um grande amigo. Quando soube fiquei paralisado. Não conseguia acreditar..." As palavras emocionadas eram o reflexo de uma Liège-Bastogne-Liège que se desenrolou num ambiente de pesar que marcou um pelotão ainda incrédulo com a trágica morte do italiano no sábado, atropelado por uma carrinha durante um treino. Valverde queria muito ganhar, não apenas por estar nos seus genes, mas porque desejava oferecer o prémio monetário à mulher e aos dois filhos, gémeos, de Scarponi. No dia em que o espanhol acrescentou mais uma vitória que consagra-o cada vez mais como os um dos melhores de sempre, Valverde mostrou também o ser humano que é ao partilhar mais um feito com Scarponi e a família.

Scarponi esteve no pensamento de todos e antes do arranque, o minuto de silêncio foi o momento arrepiante de uma homenagem merecida. No entanto, havia um monumento para disputar, o quarto do ano. Depois de uma Flèche Wallonne algo previsível e que apenas foi interessante nos quilómetros finais, a Liège-Bastogne-Liège ofereceu um espectáculo bem mais ao nível do que se pede, ainda mais quando se trata de uma das cinco clássicas mais importantes do ciclismo (Milano-Sanremo, Volta a Flandres, Paris-Roubaix, Liège-Bastogne-Liège e Il Lombardia). Não é muito vulgar no ciclismo actual, mas a fuga, que incluiu Tiago Machado (Katusha-Alpecin), chegou a ter quase 15 minutos de avanço. No pelotão esperavam que fosse a Movistar a liderar a perseguição, mas durante muito tempo foi algo confuso o que se passava. Ninguém assumia mais do uns poucos quilómetros a frente do pelotão e até chegou a ver-se um ataque, sem grande sentido e que apenas serviu para o grupo da frente continuar a ter uma vantagem que a certa altura começou a parecer que iria chegar.

Tiago Machado foi extremamente activo. Talvez um pouco de mais. Desgastou-se e se tivesse chegado ao fim e falhado um pódio, por exemplo, se calhar estaríamos a falar de como o português talvez tivesse trabalhado mais do que os companheiros de ocasião, que deveria ter sido mais frio... Mas desta vez, aquele espírito de luta foi precisamente o que lhe valeu a esperança de alcançar um resultado histórico. Tentou e deu tudo o que tinha. Foi uma exibição à Tiago Machado. Não se tem visto muito destas conhecidas qualidades do ciclista português desde que foi para a Katusha-Alpecin, mas de vez em quando lá surge das sombras e faz-nos sonhar.

Quando o pelotão finalmente organizou-se, a fuga ficou mesmo condenada. Movistar, Quick-Step Floors e BMC a trabalharem juntas, não deram hipótese. Quanto a portugueses as atenções viravam-se para Rui Costa (UAE Team Emirates) - que tanto adora a Liège-Bastogne-Liège e há um ano esteve no pódio - e ia-se espreitando para ver se José Gonçalves (Katusha-Alpecin) ainda tinha alguma cartada para jogar.

No final, os previsíveis candidatos apresentaram as suas credenciais. Daniel Martin desferiu um ataque brutal. Parecia que era desta. O irlandês ganhou distância e a segunda vitória no monumento estava cada vez mais perto. Mas onde está Alejandro Valverde, nunca há triunfos antecipados. O espanhol colou-se e esperou um pouco. Martin já pouco mais tinha a dar e Valverde deu a machada final. Pela terceira vez conseguiu a dobradinha Liège/Flèche e está a apenas uma vitória de igualar Eddy Merckx nas clássicas conquistadas na semana das Ardenas, ainda que nunca tenha ganho a Amstel Gold Race.

Na terça-feira Valverde fará 37 anos. Tens muitas razões para celebrar, pois está a viver um dos melhores anos da sua carreira. A morte de Scarponi retira alguma da felicidade destes feitos sensacionais do espanhol, que não esquecerá como a sua quarta Liège-Bastogne-Liège teve um sabor tão agridoce.

Outro ciclista que está a fazer uma excelente temporada é Michal Kwiatkowski (Sky), que fechou na terceira posição. Rui Costa foi 14º, a dez segundos, depois de ter quebrado na subida final. José Gonçalves terminou na 51ª posição a um minuto, Tiago Machado na 64ª a 3:50, André Cardoso (Trek-Segafredo) na 69ª a 4:42 e Ruben Guerreiro (Trek-Segafredo) na 88ª a 7:40. Com o mesmo tempo ficou José Mendes (Bora-Hansgrohe), que terminou no 100º lugar. Nunca Portugal tinha tido tantos representantes na Liège-Bastogne-Liège.

Tradicionalmente diz-se que o monumento fecha a época das clássicas, ainda que mais vão realizar-se durante o ano. Desta vez até falta uma nesta fase do temporada, com a Eschborn-Frankfurt a fazer a estreia no calendário World Tour, no dia 1 de Maio. Porém, inevitavelmente, fechado este período sempre espectacular das clássicas do pavé e das Ardenas, é altura de começar a olhar para a Volta Itália, Volta a França e Espanha. Para já, que venha o Giro100.

Resultados da 103ª edição da Liège-Bastogne-Liège.

`

Na corrida feminina, a holandesa Anna van der Breggen completou a tripla das Ardenas com a vitória na Liège-Bastogne-Liège, no primeiro ano em que as três clássicas fizeram parte do calendário World Tour das senhoras. E tal como na Amstel Gold Race e na Flèche Wallonne, na segunda posição ficou a companheira da Boels-Dolmans, Lizzie Deignan e a polaca Katarzyna Niewiadoma (WM3 Energie) fechou novamente o pódio. A portuguesa Daniela Reis (Lares-Waowdeals), terminou na 60ª posição, a 8:13 minutos. Veja aqui a classificação completa.

»»Muro de Huy? Não. Muro de Valverde. Espanhol ameaça recorde de Eddy Merckx««

»»O segredo do sucesso de Valverde aos 36 anos e o que seria se não fosse ciclista««

Sem comentários:

Enviar um comentário