30 de abril de 2017

Comentários racistas podem valer a Moscon seis meses de suspensão. Sky preferiu adiar possível sanção interna

(Fotografia: Facebook Gianni Moscon)
A UCI vai investigar o que aconteceu no final da terceira etapa da Volta à Romandia (na sexta-feira) entre Gianni Moscon e Kevin Reza. Os dois ciclistas envolveram-se numa acesa discussão e o italiano da Sky proferiu comentários racistas contra o ciclista da FDJ. As palavras foram admitidas pelo próprio e pela equipa britânica. No entanto, a Sky adiou para depois da corrida uma eventual sanção ao corredor, que competiu assim mais dois dias. Foi feito um pedido de desculpas, aceite por Reza e pela FDJ.

Por parte da equipa francesa compreende-se que tenha preferido colocar rapidamente um ponto final no assunto. Porém, a opção da Sky de empurrar para mais tarde uma decisão mais exemplar é questionável. Casos como estes são graves, ainda que devam ser rapidamente controlados e tratados. Não há necessidade de arrastar polémicas, é certo. Um pedido de desculpa é o mínimo exigível, mas a Sky deveria ter agido de forma mais veemente. Moscon (23 anos) ainda poderá ser sancionado pela equipa, pois o director desportivo, Nicolas Portal, garantiu que o caso não seria esquecido, mas já será tarde para ter um efeito provavelmente mais dissuasor.

Portal referiu que houve uma conversa com Moscon a explicar-lhe como tinha agido mal e que o ciclista tinha compreendido a gravidade das suas palavras. O caminho pedagógico é louvável, mas escasso. O afastamento da equipa pelo menos da corrida em causa teria sido um acto mais correcto, numa perspectiva de passar a mensagem forte que este tipo de situações não são toleradas.

"A UCI espera que todos neste desporto respeitem os mais altos níveis de ética e de conduta. Abuso racial não tem lugar no ciclismo, nem noutro desporto e qualquer queixa será investigada e sancionada se confirmada", referiu a UCI, ao Cycling News.

A utilização de linguagem abusiva tem uma sanção prevista entre um a seis meses nos regulamentos da UCI. Num caso idêntico que aconteceu em 2015, o bielorrusso Branislau Samoilau (CCC Sprandi Polkowice) proferiu comentários racistas contra Natnael Berhane (Dimension Data). Então a UCI decidiu não sancionar Samoilau, justificando que o pedido de desculpa e a doação de um ordenado à fundação da equipa sul-africana era algo que tinha deixado todos satisfeitos.

Agora é esperar para ver o que acontecerá com Moscon, não só por parte da UCI, mas também para ver se a Sky realmente avança com algum tipo de sanção (a Volta à Romandia terminou este domingo). Independentemente do que venha a acontecer, espera-se que Moscon tente resfriar os ânimos da próxima vez que possa ver-se envolvido numa discussão, por exemplo. Compreende-se que no "quente" do momento possa por vezes possa ser difícil ter cuidado com o que se diz, mas é também nessas situações que um ciclista mostra o seu carácter.

Naquele mesmo dia, Chris Froome teve uma demonstração de companheirismo que mostrou, mais uma vez, o carácter deste britânico (ver link em baixo). Moscon bem pode aprender um pouco mais com o seu líder.

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Giro. Candidatos (e não só): Pozzovivo, Van Garderen e Rolland

Domenico Pozzovivo (34 anos, Itália, AG2R La Mondiale)

Esperava-se mais da carreira de Pozzovivo. Ao serviço da estrutura agora com o nome Bardiani CSF, o italiano sempre foi um ciclista emocionante de ver. Era atacante, dava espectáculo e em 2012 alcançou o sucesso que garantidamente o iria colocar no World Tour. Venceu o Giro del Trentino e foi depois vencer uma etapa na Volta a Itália. A AG2R contratou Pozzovivo, que teve ainda a curiosidade de durante alguns anos ter dividido o ciclismo com os estudos, pois quis tirar uma licenciatura.

No entanto, o pequeno Pozzovivo não conseguiu manter o nível e ano após ano vemo-lo aparecer em algumas corridas, atacar ao estilo que apresentou no passado, mas os resultados não são os esperados. A AG2R manteve sempre a confiança no ciclista, mas com 34 anos, Pozzovivo poderá ter no Giro100 a última oportunidade de estar numa equipa World Tour como líder numa grande volta.

Não é ciclista para se sentir pressionado. É um corredor que compete muito com o coração, com as sensações, um pouco ao estilo de Contador. É por isso mesmo que quando está em forma é sempre entusiasmante vê-lo, como aconteceu recentemente na Volta aos Alpes. E essa boa forma lança algumas expectativas sobre o pequeno italiano. Será que é desta que estará na luta por uma grande vitória? Será difícil, mas é muito possível que Pozzovivo tenha o pódio em mente.

Tejay van Garderen (28 anos, Estados Unidos, BMC)

Quando se olha a idade de Van Garderen parece estranho dizer que o crédito do americano pode estar a terminar na BMC. Apareceu muito cedo e muito cedo começou a demonstrar ser um caso sério de talento. A equipa foi buscá-lo logo em 2012 e rapidamente começou a prepará-lo para ser o sucessor de Cadel Evans como líder para a Volta a França. Porém, quando chegou o momento, Tejay van Garderen teve dificuldades em retribuir com resultados a confiança nele depositada.

Por uma razão ou por outra, a verdade é que Van Garderen não consegue estar ao seu melhor nas grandes voltas. E quando o conseguiu, no Tour, uma doença obrigou-o a abandonar em lágrimas, numa imagem marcante. Mas, no geral, tem sido uma desilusão. De líder no Tour, passou a co-líder com Richie Porte em 2016. Este ano foi "empurrado" para o Giro. Como é a 100ª edição quase passa despercebido que é uma despromoção para o americano. Van Garderen aposta muito neste Giro. Se falhar, o seu futuro na BMC poderá estar em causa.

Com 28 anos, ainda tem uma grande parte da carreira pela frente. Contudo, ter de enfrentar corridas com um passado recheado de desilusões poderá ser difícil de gerir psicologicamente, principalmente quando um dos handicaps do ciclista é precisamente a força (ou falta dela) mental.

É o momento da verdade para Tejay van Garderen, que ainda por cima tem Rohan Dennis a aparecer e a ameaçar tira-lhe o protagonismo.

Pierre Rolland (30 anos, França, Cannondale-Drapac)

Esta é uma relação que não está a resultar nem de perto nem de longe como equipa e ciclista esperavam. Depois de muitos anos na Europcar (actual Direct Energie), um pouco na sombra de Thomas Voeckler, mas com resultados que também o destacaram no ciclismo francês - duas etapas no Tour e três top dez foram um excelente cartão de visita -, Rolland procurou a sua oportunidade no World Tour e encontrou uma Cannondale-Drapac à procura de mais um líder, além de Rigoberto Uran.

Porém, não tem sido uma união proveitosa. Rolland teve um 2016 muito discreto, mas parece querer mudar este ano. Trocou com Uran e enquanto o colombiano vai como líder ao Tour, o francês vai tentar a sua sorte no Giro. O sexto lugar na Volta aos Alpes é um resultado positivo. É difícil olhar para Rolland e considerar que é um candidato a lutar pela vitória na Volta a Itália, mas se o ciclista voltar à forma que apresentou na Europcar, então este Giro poderá ser o regresso aos grandes resultados.

Um top dez seria excelente, mas tendo em conta que a Cannondale-Drapac é uma equipa desesperada por vitórias - só tem uma em 2017 - falta saber qual será a prioridade: etapas ou classificação geral. Se forem as duas, naturalmente que será perfeito, mas Rolland sabe que está pressionado a conseguir algo de muito positivo neste Giro se não quiser ser considerado uma aposta falhada da equipa americana.

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Scarponi não tem substituto. Astana vai ao Giro com menos um ciclista para homenagear o seu líder

Scarponi após a sua última vitória, na primeira etapa na Volta aos Alpes
(Fotografia: Facebook Astana)
A pergunta de quem iria substituir Michele Scarponi estava sem resposta há uma semana. A Astana decidiu homenagear o seu ciclista na 100ª edição da Volta a Itália: se não pode ter Scarponi, então não haverá ninguém para o substituir e a equipa irá mesmo para a corrida com menos um ciclista.

Com Fabio Aru a recuperar de uma queda que lhe provocou uma grave lesão no joelho, o veterano Scarponi ia ser o número um da Astana. A sua morte - foi atropelado durante um treino perto da sua casa em Filottrano - provocou um choque generalizado, mas naturalmente que, no ciclismo, atingiu particularmente a formação cazaque. O ano já estava a ser muito mau. Tinha sido Scarponi a dar a primeira vitória à equipa em 2017 (e única até ao momento) poucos dias antes do trágico acidente. Sem Aru, caiu por terra o principal objectivo da Astana: a vitória no Giro100. De Scarponi não se esperava um triunfo, mas a sua experiência e visto ter demonstrado boa forma na Volta aos Alpes, a equipa esperava alcançar uma boa classificação e talvez juntar uma ou outra tirada.

Esse objectivo naturalmente que se mantém, mas Alexander Vinokourov optou por deixar o dorsal um da Astana sem dono em homenagem a Scarponi. Menos um homem complicará a missão de Dario Cataldo ou Tanel Kangert de ficarem no top 10. É muito possível que se veja uma Astana muito activa no Giro à procura de vitórias que certamente os seus ciclistas ambicionam mais do que nuncal, com o desejo de as dedicar àquele que deveria ter sido o seu líder na ausência de Aru. O espanhol Luis Leon Sanchez é um corredor que deverá dispor de liberdade total para alcançar esse triunfo.

"Penso que é a decisão correcta e tenho a certeza que os organizadores do Giro, tal como toda comunidade do ciclismo, vão aceitar e compreender", afirmou o director da Astana, Alexander Vinokourov. Nas grandes voltas as equipas têm de se apresentar com nove ciclistas, incorrendo numa multa caso comecem com menos. Sendo um caso excepcional, aguarda-se agora pela decisão de Mauro Vegni, director da Volta a Itália.

Os eleitos da Astana para o Giro100 foram Pello Bilbao, Zhandos Bizhigitov, Dario Cataldo, Jesper Hansen, Tanel Kangert, Luis Leon Sanchez, Paolo Tiralongo e Andrey Zeits.



Vinokourov aproveitou também para garantir que a Astana não vai ficar por esta homenagem: "Obviamente que esta não é a única iniciativa que a Astana está a preparar para recordar o Michele e também para ajudar a sua família. Já começámos algo tão importante como uma angariação de fundos para a família dele e vamos fazer muito mais nos próximos meses."

O director da Astana salientou que irão correr todos os dias do Giro e noutras corridas para honrar a memória de Michele Scarponi, que aos 37 anos morreu de forma tão trágica.

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29 de abril de 2017

Ciclista da Axeon Hagens Berman morre aos 21 anos

(Imagem: Axeon Hagens Berman)
Ainda o mundo do ciclismo está a tentar lidar com a morte de Michele Scarponi há uma semana e é abalado por uma nova notícia trágica. Chad Young era ainda um jovem ciclista, mas apontado como de grande talento. Aos 21 anos ia demonstrando cada vez mais as suas qualidades. Mas o ciclismo tem destas coisas. Tem tanto de bonito como de repente relembra a todos a fragilidade da vida humana. Uma violenta queda tirou a vida a um jovem promissor, que deixou a Axeon Hagens Berman, - equipa dos gémeos Oliveira - em choque.

Chad Young caiu numa descida no Tour de Gila no último domingo. Nesse mesmo dia quis o destino que a equipa tivesse razões para celebrar, pois a difícil etapa foi ganha pelo colega Edward Anderson. Mas a festa durou pouco. Young, que caiu com um companheiro que conseguiu prosseguir a corrida, foi imediatamente assistido e não demorou muito a ser transportado de helicóptero para o hospital. Desde logo que o estado foi determinado como grave. Esta sexta-feira, a Axeon Hagens Berman publicava um comunicado que deixou todos à espera do pior. Nele escreveu que não havia perspectivas de Young recuperar. Faleceu este sábado.

"Perdemos um amigo, um colega de equipa e um membro da família. Não tenho palavras para exprimir a minha dor por esta perda. Só posso dizer que estou agradecido por tê-lo conhecido e por ter podido partilhar com ele a paixão pelo ciclismo", escreveu no site da equipa o director Axel Merckx.

Ivo Oliveira reagiu no Twitter à morte do colega de equipa, deixando as suas condolências. "Serás sempre recordado", escreveu.
Era o segundo ano de Chad Young na Axeon Hagens Berman - em 2016 foi colega de Ruben Guerreiro - e o americano estava a consolidar-se como uma das jovens promessas do ciclismo daquele país. Young esteve recentemente em Portugal, na Clássica Aldeias do Xisto, tendo terminado na 59ª posição.

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Giro. Candidatos (e não só): Landa, Dennis e Carthy

Mikel Landa (27 anos, Espanha, Sky)

De uma das grandes contratações de 2016, Mikel Landa acabou por ser um dos maiores flops. Muito dificilmente o ciclista e a Sky pensariam que tudo pudesse correr tão mal. Era um talento na Astana, "tapado" pelas lideranças de Fabio Aru e Vincenzo Nibali. A Sky ofereceu-lhe um lugar de destaque para a Volta a Itália e eventualmente para a Vuelta, ficando aqui dependente se Chris Froome fosse ou não à corrida. Mas era o Giro que Landa queria. O ciclista admite que é a grande volta que mais gosta.

Depois do pódio de 2015 as expectativas eram enormes. Fez uma exibição à Chris Froome, ou seja, tinha a missão de apoiar Aru, mas em várias ocasiões deixou indicações que estaria melhor fisicamente que o seu chefe de fila, como aconteceu com Froome quando levou Bradley Wiggins à vitória no Tour. No entanto, a desilusão foi do tamanho das expectativas. Landa começou mal o Giro, ainda apareceu na oitava etapa, mas acabou por abandonar devido a uma gastroenterite, que aliás foi quase uma praga no pelotão do Giro há um ano.

Landa perdeu quase de imediato a confiança da Sky. Foi como gregário ao Tour, mas quando esperava recuperar o seu estatuto de líder para uma nova oportunidade, a equipa decide uma liderança partilhada com Geraint Thomas, sendo claro que o britânico será o plano A e Landa o plano B.

Primeira escolha ou não, Landa não tem margem para erros. Se voltar a ter uma época apagada pode muito bem ver a sua passagem pela Sky terminar sem glória, pois tendo em conta que é um dos ciclistas mais bem pagos da equipa, será difícil ficar como gregário, até porque não é uma poisição que queira. Mas com Thomas a querer um papel de destaque, com Wout Poels a exigir o mesmo e com um Sergio Henao a começar a merecer a sua oportunidade... É agora ou nunca para Landa.

Rohan Dennis (26 anos, Austrália, BMC)

É o homem do plano a quatro anos para se tornar num grande voltista. Mas será que vamos ter de esperar mesmo tanto tempo? Depois de demonstrar que é muito forte no contra-relógio, que as corridas de uma semana encaixam perfeitamente nas suas características, Rohan Dennis quer agora dar o próximo passo: tornar-se no próximo australiano a ganhar uma grande volta. Ou seja, ocupar um lugar que continua vago após a retirada de Cadel Evans.

A questão é que Dennis apareceu muito bem em 2017. Começou o ano com um expectável título nacional de contra-relógio, venceu a La Provence e foi segundo no Tirreno-Adriatico, atrás de Nairo Quintana. A BMC está disposta a esperar para garantir que tem um vencedor, mas talvez quatro anos seja mesmo demasiado tempo, ainda mais quando Tejay van Garderen é uma desilusão cada vez maior.

Não há dúvida que o americano vai como líder. Mas o Giro não deixa de ser uma despromoção para quem queria ganhar o Tour. Richie Porte tirou-lhe estatuto e com Rohan Dennis a evoluir a olhos vistos, a ver vamos se neste Giro não será o australiano a tornar-se na outra grande referência da BMC para as três semanas, atrás de Richie Porte, que entretanto quer ver se é ele a suceder a Cadel Evans, antes de Dennis.

Hugh Carthy (22 anos, Grã-Bretanha, Cannondale-Drapac)

No que diz respeito à classificação da juventude, Hugh Carthy é um forte candidato. É muito novo e está a fazer a sua estreia no World Tour. Mas qualidade não lhe falta, como mostrou novamente na recente Volta aos Alpes.

Quando vir um ciclista alto (1,89 metros), muito (mas mesmo muito) magro, com um estilo algo estranho de pedalar, não há dúvidas que é Carthy. O seu estilo é já a sua imagem de marca e o britânico quer que as grandes vitórias sejam o seu destino. Mostrou ambição antes de chegar ao Giro e garante que quer brilhar neste grande palco que será a 100ª edição desta corrida.

Na Caja Rural tornou-se óbvio que Hugh Carthy tinha o necessário para chegar ao World Tour e a Cannondale-Drapac espera que o britânico possa começar a render vitórias, até porque a equipa bem precisa delas.

Será difícil entrar num top dez - certamente que o fará num futuro próximo -, mas atenção que fará tudo por uma etapa e tem todas as características para ser mais um jovem animador do Giro.

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Histórias do Giro. Foi na Volta a Itália que Merckx abriu a contagem nas grandes voltas

(Fotografia: Wikimedia Commons)
Em qualquer grande corrida que já existisse nos anos 60, é difícil falar de aniversários especiais e não falar de um ciclista ainda mais especial: Eddy Merckx. Hoje em dia, quando se fala em bater recordes, há uma grande probabilidade da marca pertencer ao belga. No que diz respeito a grandes voltas, foi precisamente no Giro que o ciclista começou a alimentar a alcunha de Caníbal. Em 1968 venceu a primeira e o ciclismo nunca mais seria o mesmo.

Então já tinha algumas grandes vitórias, como o mundial em 1967 e duas Milano Sanremo. Tinha apenas 23 anos quando venceu pela primeira vez o Giro, mas arrasou a concorrência que se viu obrigada a lutar pelo segundo lugar. Dada a superioridade do então jovem belga, era o melhor que os restantes ciclistas podiam aspirar. Merckx conquistou ainda nesse ano a classificação da montanha e por pontos. No ano seguinte, um controlo de doping positivo afastou-o da vitória. Mas ganhou a Volta a França. Foram cinco vitórias no Giro e outras tantas no Tour. Em Itália, três foram consecutivas, entre 1972 e 1974. Juntamente com Fausto Coppi e Alfredo Binda detém o recorde de vitórias (recorde... lá está). Ganhou ainda 24 etapas entre 1967 e 1974. A primeira tirada em grandes voltas também foi ganha no Giro. De destacar ainda que fez a dobradinha em três ocasiões.

Tal como aconteceu com a França, apesar da Bélgica ser uma das potências do ciclismo, ganhar o Giro parecia ser uma missão quase impossível. Até hoje além de Merckx, só Michel Pollentier (1977) e Johan de Muynck (1978) o fizeram. Os recordes até podem ir caindo, é assim que é suposto ser, mas independentemente dos anos que passem, dos recordes que vá vendo serem batidos, Merckx deixou a sua marca em praticamente todas as grandes corridas do ciclismo e a Volta a Itália não foi excepção.


28 de abril de 2017

Chris Froome mostra porque é um grande líder na vitória de Elia Viviani

Primeira vitória do ano para Elia Viviani (Fotografia: Facebook Volta à Romandia)
Como compensar um ciclista italiano com capacidade de lutar por vitórias, que está numa das principais equipas mundiais e que foi excluído no Giro100, a Volta a Itália onde todos os transalpinos querem estar? Chris Froome mostrou como se pode tentar compensar. É difícil ser uma compensação completa. Elia Viviani não esconde a tristeza por não ter sido chamado para a 100ª edição do Giro, mas Froome mostrou que um líder não é apenas aquele que tem uma equipa a trabalhar para ele, é um líder que sabe motivar os colegas, trabalhando ele também quando é preciso.

Foi uma atitude muito bonita. É certo que ir na frente de um sprint é algo normal para os homens da geral, que tentam assim evitar problemas que lhes possam custar segundos. Mas Froome não esteve na frente para se proteger. Trabalhou, pedalou que nem um gregário que prepara os sprints, dando grande velocidade ao pelotão, sempre a pensar que a terceira etapa da Volta à Romandia podia ir para Viviani. E se havia dia que Froome queria ver o colega ganhar e sabia que um triunfo poderia fazer a diferença era hoje, numa tentativa de garantir que o italiano não perca motivação perante a tristeza de ter de ver o Giro pela televisão.

Foi um exemplo de liderança. Um chefe-de-fila tem de respeitar para ser respeitado e o que fez Froome foi de um companheirismo exemplar. São atitudes destas que fazem com que bons ciclistas não se importem de sacrificar resultados próprios, para garantir que o britânico conquiste mais uma Volta a França.



A notícia surpresa do dia foi mesmo essa: Elia Viviani não vai ao Giro100. Já se sabia que a Sky ia apostar forte com a dupla Geraint Thomas e Mikel Landa, mas sempre se acreditou que Viviani teria o seu lugar, mesmo que não tivesse ajuda nas etapas ao sprint, situação a que até está habituado desde que foi para a formação britânica. No entanto, a equipa vai mesmo atacar com toda a força a geral e quer todos os ciclistas concentrados nesse objectivo, descartando aquele que seria para tentar etapas aos sprints e que não seria uma ajuda nas muitas etapas montanhosas da Volta a Itália.

"Claro que estou desiludido por falhar o Giro, mas a táctica da equipa é ir a 100% pela geral com o Thomas. Já se sabe como é com a Sky quando vai pela geral, como acontece no Tour. Eu compreendo. Eu queria lá estar, mas esta foi a decisão", afirmou um conformado Viviani ao Cycling News. O sprinter acabou também, sem querer, por desfazer qualquer dúvida que poderia haver: Thomas é mesmo o líder, Landa será um plano B. Viviani ainda referiu como é uma edição especial do Giro, ainda mais com o regresso da camisola ciclamino para o líder da classificação por pontos, que claramente tinha o objectivo de tentar ganhar. "Depois da Volta aos Alpes, ele [Thomas] mostrou estar muito confiante em ganhar ou estar no pódio [no Giro]. Espero vê-lo na frente da corrida", acrescentou.

Viviani terá de se contentar com a Volta à Califórnia, que este ano integra pela primeira vez o calendário World Tour. É uma competição que nos últimos anos tem atraído bons ciclistas, como Peter Sagan e Julian Alaphilippe. Porém, será um teste à capacidade mental de Viviani, que terá de reagir àquela que poderá ser a maior desilusão da sua carreira, pois não terá a possibilidade de sequer tentar escrever o seu nome no Giro100.

A ver vamos o que esta situação poderá resultar na relação futura entre Sky e Viviani. O italiano foi para a equipa britânica em 2015, mas não tem sido fácil ganhar corridas, pois está normalmente sozinho, ou apenas com um companheiro, quando vai para os sprints. Mark Cavendish rapidamente saiu da equipa quando percebeu que apesar do seu brilhante currículo, seria sempre preterido em prol da protecção do então líder Bradley Wiggins. Viviani não se importou de ter um papel mais solitário na procura de vitórias. 

Porém, elas têm sido poucas - esta foi a primeira em 2017 - e já se vai discutindo o futuro do ciclista na equipa. Tem contrato até 2018 e a decisão de o deixar de fora da especial Volta a Itália, que começa na próxima sexta-feira, poderá servir de "empurrão" para o transalpino começar a pensar numa mudança. Tem 28 anos (feitos em Fevereiro) e não seria de admirar se tentasse procurar uma equipa que o pudesse ajudar a somar mais vitórias. Pode parecer que não ganha muito, mas a verdade é que tem 41 triunfos como profissional, muitas delas ao serviço da Liquigas, que depois se uniu à Cannondale.

O que Froome fez é de líder e certamente que Viviani apreciou o gesto, mas a desilusão e a frustração dificilmente irão desaparecer, principalmente quando o Giro começar e o italiano não estiver lá.

A Sky vai ter na Volta a Itália Geraint Thomas, Mikel Landa, Kenny Elissonde, Philip Deignan, Michal Golas, Vasil Kiryienka, Sebastián Henao, Diego Rosa e Salvatore Puccio.




Giro. Candidatos (e não só): Jungels, Brambilla e Verona

Bob Jungels (24 anos, Luxemburgo, Quick-Step Floors)

Com a saída de cena algo inglória dos irmãos Schleck, o Luxemburgo olha com enorme esperança para Bob Jungels. Depois de evoluir na estrutura da actual Trek-Segafredo - passou inclusivamente pela equipa de formação em 2012 - Jungels optou por trocar de ares e assinou pela Quick-Step Floors, atraído pela perspectiva de rapidamente conseguir ter a possibilidade de se mostrar numa grande volta. E assim foi.

Na Trek-Segafredo a saída de Jungels foi vista como quase uma traição pelos directores da equipa, que tinham grandes planos para Jungels. Mas o luxemburguês não quis esperar e na Volta a Itália de 2016 começou a comprovar aquilo que se esperava dele, talvez até mais cedo que o próprio Patrick Levefere, que o contratou, esperava. Chegou a liderar a corrida e venceu a classificação da juventude. Foi campeão nacional de contra-relógio e da prova em linha e venceu o título mundial de contra-relógio colectivo.

Há um ano foi aposta (ganha) apenas no Giro, mas em 2017 terá pela frente também o Tour. Porém, não há dúvidas que é em Itália que se quer apresentar ao seu melhor. Jungels parte com ambição para a corrida. Não se pode dizer que é um candidato à vitória, mas a expectativa é enorme para ver se consegue pelo menos repetir o que fez em 2016, sendo que a Quick-Step gostaria de o ver entrar no top cinco e apontar a um pódio. Difícil, mas este Jungels tem tudo para ser um excelente voltista.

Gianluca Brambilla (29 anos, Itália, Quick-Step Floors)

2016 foi um ano inesquecível para Brambilla. Viveu um autêntico sonho durante Volta a Itália. Venceu uma etapa, vestiu a camisola rosa que tanto o emocionou e apesar de ao longo da corrida ter perdido algum protagonismo, manteve-se como uma ajuda preciosa a Jungels. Na Volta a Espanha também ganhou uma etapa. E Brambilla quer tentar repetir o sucesso de há um ano e talvez ir mais além.

Sabe que não é visto como um potencial candidato. É um bom trepador, mas as suas qualidades são mais adequadas para quem quer tentar ganhar etapas (ou clássicas). Será esse o objectivo de Brambilla. Estará certamente ao lado de Bob Jungels, mas no italiano recaem grandes expectativas de ser um dos homens espectáculo do Giro. Gosta de atacar, de arriscar e voltar a vestir aquela maglia rosa, nem que seja por um dia, será um dos principais objectivos do ano.

A Quick-Step pode ter em Jungels o homem para a geral, mas sabendo como está viciada em vitórias este ano (24), irá certamente tentar prosseguir essa senda com etapas no Giro e Brambilla é o ciclistas de características perfeitas para alguns dos dias. Entrar em fugas será um dos planos e o corredor irá tentar aproveitar uma das poucas oportunidades que irá gozar na equipa para alcançar resultados para ele próprio.

Carlos Verona (24 anos, Espanha, Orica-Scott)

Verona não é um candidato à vitória, mas é um candidato a dar espectáculo. O espanhol pertence a uma nova geração daquele país com um enorme potencial. A Orica-Scott sabia bem o que estava a fazer quando não se importou de pagar para ter Verona ainda durante 2016, com Patrick Lefevere a estar desta feita do outro lado da barricada, ou seja, o director belga não gostou nada de perder um ciclista que ajudou a evoluir nos últimos anos.

O Giro será a oportunidade para Verona se mostrar, ainda que tenha Adam Yates como líder indiscutível. Mas a Orica-Scott certamente que dará a possibilidade do espanhol dar algum espectáculo, pois é um ciclista que gosta de correr ao ataque.

Carlos Verona não entra na lista de candidatos, mas na lista de ciclistas a seguir com atenção. Este poderá ser o ano em que o espanhol começa a afirmar-se e a procurar o seu espaço para em breve ser ele um dos líderes. Dele podemos esperar animação, lutar por etapas e talvez um top 20.

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Histórias do Giro. Custou, mas um francês lá conseguiu vencer a Volta a Itália

(Fotografia: Wikimedia Commons)
Numa era em que Bélgica, Itália e França eram as grandes potências do ciclismo, os gauleses não encontravam forma de conquistar um Giro. Jean Alavoine foi terceiro em 1920, Louison Bobet ficou em segundo em 1957, mas foi preciso esperar por 1960 para que finalmente um francês inscrevesse o seu nome na Volta a Itália. E teve de ser um dos principais ciclistas da história do ciclismo francês: Jacques Anquetil.

Três anos antes, este brilhante ciclista tinha arrasado a concorrência no Tour, vencendo com quase 15 minutos de vantagem perante o belga Marcel Janssens. Tinha apenas 23 anos, mas uma ambição enorme. No Giro não foi tão dominador, mas venceu por 28 segundos o italiano Gastone Nencini e deixou ainda para trás o luxemburguês Charly Gaul. Ambos os corredores já tinham vencido a Volta a Itália. Foi o início da era Anquetil que só voltou a ganhar o Giro em 1964, mas entre 61 e 64 foi rei e senhor no Tour e em 63 somou ainda uma Vuelta. Em Itália, o francês venceria também seis etapas. Na sua última conquista, quando passou por Roma, Anquetil até teve direito a uma benção papal. Nunca mais ganhou nenhuma grande volta depois daquele fantástico ano.

Porém, os ciclistas franceses não conseguiam ter o sucesso que alcançavam na sua grande volta, ao contrário dos italianos, que não só dominavam em casa, como ainda iam até França ganhar alguns Tours. Depois de Anquetil, Bernard Hinault conquistou a Volta a Itália em 1980, 82 e 85 e Laurent Fignon em 1989. Nesta altura, já tinha começado o jejum de vitórias francesas no Tour, que duram desde 85. Hinault foi o último a ganhar. A toda poderosa França nunca conseguiu singrar em Itália e perdeu força no ciclismo com o passar dos anos. Em 2017 Thibaut Pinot (FDJ) aparece com a vontade de quebrar o longo hiato. Talvez possa ser ele o próximo francês a fazer parte das histórias do Giro...


27 de abril de 2017

Rui Costa à caça de etapas na Volta a Itália

(Fotografia: Facebook Rui Costa)
Depois de tantos anos a ter a Volta a França como principal objectivo, primeiro como gregário, mas com alguma liberdade para perseguir etapas na Movistar, depois como líder da Lampre-Merida, Rui Costa resolveu fazer uma alteração nos seus objectivos, no ano em que a equipa mudou de dono. O ciclista português optou por estrear-se no Giro e revelou qual será a sua ambição: "O Giro100 irá oferecer etapas que podem encaixar nas minhas características e eu sempre gostei de ir à caça de etapas."

Em declarações citadas no site oficial da Volta a Itália, Rui Costa referiu que ter sucesso nesta competição será algo significativo, ainda mais sendo a sua estreia. Feliz por ter a oportunidade de estar no Giro, o ciclista da UAE Team Emirates recordou que não tem passado muito por Itália, mas deixou muitos elogios, como as paisagens, a comida e as grandes corridas, como a Milano-Sanremo e a Lombardia, além do Giro. E claro, foi em Itália que o português viveu o maior momento da sua carreira (e um dos maiores do ciclismo nacional): em Florença (2013) conquistou o título de campeão do mundo.

"Os italianos são simpáticos e recebem bem. Digo isto por experiência pessoal. Tive muita sorte em integrar uma equipa italiana de sucesso [Lampre-Merida], tendo todos sido excepcionais em ajudar-me na minha adaptação. O estilo de vida e a cultura portuguesa não é assim tão diferente do italiano", frisou.

Rui Costa está a viver um novo fôlego no ciclismo, tendo este ano regressado às vitórias. Conquistou a etapa rainha da Volta a San Juan, depois vez o mesmo em Abu Dhabi (prova do World Tour e de onde é a sua equipa actualmente), tendo juntado a vitória na classificação geral. Os resultados são animadores, pelo que há grandes expectativas para o que poderá fazer Rui Costa no Giro. Já tem três etapas no Tour e quer agora juntar umas da Volta a Itália.

(Imagem: UAE Team Emirates)
A UAE Team Emirates confirmou a equipa que estará na 100ª edição da prova italiana e a grande surpresa acabou por ser a ausência de John Darwin Atapuma. O colombiano era apontado como o ciclista que estaria na luta pela geral, ficando Rui Costa com mais liberdade para perseguir as vitórias de etapa. Porém, a formação irá apostar muito na juventude de Valerio Conti (24 anos e que em 2016 venceu em grande estilo uma tirada na Vuelta) e Matej Mohoric (22 anos). São dois ciclistas talentosos, mas dificilmente estarão na discussão por um top 10. No entanto, Sacha Modolo terá o apoio que precisa para tentar estar na discussão dos sprints. O grande objectivo da UAE Team Emirates passa claramente por triunfos nas etapas, apesar de ter deixado de fora o ciclistas que nos últimos anos mais vitórias tem dado à estrutura: Diego Ulissi. O italiano irá à Volta a França.

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Histórias do Giro. O aparecimento de dois dos maiores mitos do ciclismo

Fausto Coppi (Fotografia: Wikimedia Commons)
Até 1950 os italianos dominaram quase por completo o pódio do Giro. Só em quatro edições um estrangeiro (dois belgas e um francês) conseguiram "furar" o domínio e o suíço Hugo Koblet foi o primeiro a vencer a Volta a Itália. Essa predominância italiana permitiu o aparecimento de ciclistas que se tornariam autênticos mitos da modalidade. Depois da era Alfredo Binda, foi a era de Gino Bartali e o grande Fausto Coppi.

Primeiro apareceu Bartali. A primeira de três vitórias no Giro surgiu num ano complicado a nível político. Em 1936 a Itália sofreu pesadas sanções devido à crise de Abissínia. A instabilidade na Europa ia também aumentando, com a aliança entre Itália e Alemanha. Nesse ano só participaram ciclistas transalpinos no Giro. Tal não retira mérito à vitória de Bartali, que no ano antes tinha vencido uma etapa e conquistado a primeira de sete classificações da montanha.

Porém, o sucesso de 1936 que parecia estar a lançar a sua carreira, quase que acabou por ser o único. Bartali venceu a Volta a Itália e o Giro da Lombardia, mas a morte do irmão levou o ciclista a ponderar abandonar. Foi convencido a regressar e tornou-se no grande ciclista italiano antes da Segunda Guerra Mundial: venceu ainda o Giro de 1937 e o Tour de 1938. Ainda antes da paragem devido à guerra apareceu Fausto Coppi e foi o início de uma das maiores rivalidades da história do Giro. Coppi venceu em 1940, mas foi preciso esperar por 1946 para que, após o final da guerra, se assistisse à rivalidade em todo o seu esplendor.

Gino Bartali
(Fotografia: Wikimedia Commons)
Primeiro ganhou Bartali e Coppi foi segundo, no ano seguinte inverteram as posições. Em 1949 Coppi voltou a bater Bartali, que no ano seguinte foi novamente segundo atrás de Koblet. A entrada na década de 50 acabou por ditar também a fase descendente da carreira de Bartali, enquanto Coppi venceu mais dois Giros (ao todo foram cinco, um recorde que partilha com Alfredo Binda e Eddy Merckx) e um Tour.

Durante muitos anos Itália esteve dividida no apoio a Bartali e Coppi, dois ciclistas que discutiram vários triunfos e elevaram o ciclismo italiano a um nível difícil de igualar. Depois de se retirar, Bartali terá perdido grande parte do dinheiro que ganhou, tendo vivido na sua Florença até morrer em 2000. Dez anos depois veio a público o papel que o antigo ciclista teve durante a Segunda Guerra Mundial, ajudando judeus a fugir à perseguição nazi. Terá mesmo escondido uma família na sua casa e Bartali terá ainda ajudado a resistência.

Fausto Coppi foi um dos soldados do exército italiano na guerra. Como ciclista acabaria por cair em desgraça devido à sua vida pessoal. Coppi foi acusado de adultério em 1955. A situação foi de tal forma grave que o Papa Pio XII recusou abençoar uma edição do Giro se Coppi participasse. Apesar dos apelos para voltar para a esposa, Coppi recusou e manteve a relação vista com imprópria - teve um filho -, o que fez com que os que chegaram a ser seus fãs, lhe cuspissem durante as corridas.

A vida de atleta admirado tinha terminado. Em 1960 Coppi aceitou ir ao Burkina Fasso competir contra alguns ciclistas locais. Foi infectado com malária e faleceu aos 40 anos. Já neste século surgiram notícias que Coppi teria sido assassinado, com recurso a veneno ou a uma overdose. Nunca nada foi provado. Porém, hoje em dia Coppi é novamente admirado pelo excelente ciclista que foi, pela forma como enfrentava as montanhas, pela rivalidade com Bartali que tanto espectáculo proporcionou no Giro e não só.

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Portugal na rota da Volta a Espanha

(Fotografia: Facebook La Vuelta)
Até 2020 Portugal poderá voltar a fazer parte do percurso da Vuelta. Este é um dos objectivos do actual responsável pela organização da competição, Javier Guillén, que tem ainda outras ambições, que incluem tentar ir até Marrocos. A concretizar-se não será a primeira vez que o pelotão da Volta a Espanha vem a Portugal: aconteceu em 1998, ano em que se realizou a Expo em Lisboa. Desde então que o ciclismo passou por uma natural evolução, incluindo a própria Vuelta, que é hoje considerada por muitos a prova de três semanas com um percurso mais emocionante, batendo mesmo o Tour. Os grandes nomes do ciclismo marcam presença assídua na corrida, o que poderá significar que além da Volta ao Algarve, os fãs portugueses podem ver alguns dos principais ciclistas do pelotão por terras lusas e estamos mesmo a falar dos corredores que lutam pelas provas de três semanas.

"Temos novas ideias para colocar em prática até 2020. Portugal oferece variáveis interessantes na montanha, junto à fronteira", afirmou Javier Guillén, em entrevista ao jornal espanhol As. No entanto, o responsável não especificou que montanhas. É certo que a Serra da Estrela será das mais populares, mas há outras opções, como ficou comprovado recentemente na Clássica das Aldeias do Xisto, uma corrida que fez lembrar algumas etapas da Vuelta, com constante sobe e desce e uma rampa brutal para terminar.

Apesar de neste momento a prioridade ser garantir que a próxima edição decorra de forma perfeita, com o percurso de 2017 feito e apresentado, é natural que a organização já esteja e pensar e a elaborar os primeiros esboços da corrida de 2018.

E a introdução de um ou mais etapas que passem por Portugal poderá também escancarar as portas para uma equipa portuguesa receber um convite para a grande volta. No entanto, primeiro é preciso que esteja no escalão Profissional Continental. O timing poderá ser perfeito se a W52-FC Porto concretizar o objectivo do seu director desportivo, Nuno Ribeiro, e subir de categoria já em 2018. Entretanto também já se vai falando que o projecto do Sporting-Tavira estará a pensar em também levar a equipa para outro nível.

A revelação de Javier Guillén é uma excelente notícia para o ciclismo nacional, que nos últimos anos tem feito frente à crise, com o crescimento de competições, como a Volta ao Algarve e Alentejo, e com as próprias equipas a terem um aumento de qualidade substancial. Agora é esperar para saber se o ideia de Guillén se concretiza e, se sim, quando.

Mas há mais planos, como visitar Ceuta e Melilha e tentar fazer uma incursão por Marrocos. Porém, parece que o principal objectivo será tentar que a Vuelta passe pelas Canárias. "Tenho o sonho de acabar com quatro etapas, duas nas Canárias e duas em Tenerife", admitiu Javier Guillén. A logística será o maior desafio, com os custos a rondarem os dois milhões de euros. A vontade é grande e talvez a presença do Giro na Sardenha e Sicília este ano, poderá servir de aprendizagem para outras organizações.

A Vuelta tem inovado nos últimos anos, tendo tornado-se numa grande volta com pouco espaço para sprinters, beneficiando os grandes trepadores, que precisam de estar preparados para três semanas infernais, sem possibilidade de ter etapas de "descanso", com as tiradas difíceis a surgirem logo no início e até final, ao contrário do que normalmente acontece no Tour, por exemplo. O Giro já tem uma mentalidade idêntica e a 100ª edição é a prova disso mesmo.

26 de abril de 2017

José Mendes líder da Bora-Hansgrohe na Volta a Itália

(Fotografia: Stiehl Photography)
Será um grande momento na carreira de José Mendes. A camisola de campeão nacional estará não só na 100ª edição do Giro, como estará no corpo do líder de uma equipa do World Tour. José Mendes tinha como ambição para este ano estar na Volta a Itália, a grande volta que lhe faltava. Tudo indicava que seria o braço direito de Leopold König, mas uma lesão no joelho obrigou o checo a mudar os planos e a Bora-Hansgrohe recorreu ao ciclista português, que assim tem uma nova excelente oportunidade, depois de ter sido o líder da então Bora-Argon18 na Volta a Espanha.

Os nove ciclistas que a Bora-Hansgrohe vai apostar no Giro100 foram hoje confirmados. Quando José Mendes foi o escolhido na Vuelta foi um prémio mais do que merecido para um ciclista que desde 2013 tem sido fundamental na evolução da equipa. Com os planos para subir de categoria, a estrutura manteve o contrato com o português que voltaria a ter um papel mais de apoio, depois do destaque na Vuelta. Nessa corrida ainda se chegou a ver o campeão nacional mostrar-se, mas infelizmente um problema no joelho perturbou a sua condição física.

Esta escolha da Bora-Hansgrohe denota a confiança que os directores desportivos mantêm em José Mendes. É certo que König foi contratado - um regresso à equipa depois de uma passagem apagada na Sky - para o Giro e provavelmente para a Vuelta, com Rafal Majka a ser aposta para o Tour e Vuelta. Sem König a confiança recai num homem da casa e é a oportunidade de uma carreira para José Mendes. A Bora-Hansgrohe faz o primeiro ano como formação do World Tour e na primeira grande volta, é o campeão nacional que irá liderar no ataque à geral.

José Mendes aspirava estar no Giro para dizer que esteve nas três grandes voltas. O sonho concretizou-se com um grande bónus. Pode agora dizer que esteve nas três grandes voltas, duas delas como líder.

O que podemos esperar de José Mendes?

O campeão nacional é um bom trepador. Na Volta a Espanha de 2016 não se deixou intimidar por aquelas rampas que se tornaram imagem de marca da corrida e chegou a ver-se que tinha capacidade para ir ao ritmo dos melhores em certas etapas. Porém, a lesão no joelho limitou-o e foi difícil manter a regularidade obrigatória para conseguir um resultado de relevo, como um top 20, por exemplo. Terminou na 54ª posição, a mais de duas horas de Nairo Quintana, mas não houve nada a apontar. Não desistiu, lutou com as armas que teve e como o joelho deixou.

Aos 32 anos está numa edição sempre especial de uma corrida de tanta importância como é o Giro. Resta-nos esperar que José Mendes possa estar a um grande nível e retribuir a confiança que a Bora-Hansgrohe depositou nele.

(Imagem: Bora-Hansgrohe)

A seu lado estará Jan Bárta, ciclista checo da mesma idade, que está na estrutura desde 2010 e que poderá ser também uma possibilidade para lutar por um bom lugar na geral. Com Mendes e Bárta, um dos planos da equipa poderá mesmo por tentar que um deles possa lutar por uma etapa, podendo ficar outro mais resguardado para a geral. Há que não esquecer que os pontos na classificação geral de uma grande volta são importantes para o ranking UCI.

Sam Bennett e um Matteo Pelucchi estarão com o objectivo de conquistar etapas aos sprint. Cesare Benedetti, Patrick Konrad, Gregor Muhlberger, Lukas Postlberger e Rudi Selig serão os homens de trabalho.

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