30 de setembro de 2016

De autor de uma recuperação milagrosa a azarado do ano

(Fotografia: Facebook de Adriano Malori)
Quando a 9 de Setembro Adriano Malori começou o Grande Prémio do Quebéque, estava-se perante um feito para o ciclista da Movistar, mas também perante um exemplo de superação física e mental. Oito meses depois de uma queda cujas consequências obrigaram os médicos a colocá-lo em coma induzido, o italiano tinha completado uma recuperação milagrosa - nas suas próprias palavras - e voltava a ser um atleta de alta competição. Porém, Malori parece perseguido por azar, pois 19 dias, uma nova queda, clavícula partida e mais uma recuperação pela frente.

A história de Adriano Malori começou a 22 de Janeiro no Tour de San Luis, na Argentina. Esse dia mudou a vida do italiano. Malori confessou que agora encara tudo de forma diferente. As prioridades mudaram aos 28 anos. Mas voltando àquele dia. O ciclista da Movistar apenas se recorda que tinha falado com Vincenzo Nibali (Astana) para tentar fugir. A partir daí, foi o colega Francisco Ventoso que lhe contou o que aconteceu. Iam a cerca de 65 quilómetros de hora quando Malori passou por um buraco. A queda dificilmente poderia ter sido mais aparatosa. Foi com o rosto ao chão. "O cérebro moveu-se, roçou sobre o meu crânio e devido a isso fiquei com um hematoma", explicou Malori na conferência em que anunciou o seu regresso à competição. "Por causa do acidente tenho quase metade da cara de titânio!"



Em coma induzido durante alguns dias, dos primeiros em que esteve acordado pouco se recorda, mas sabe que a namorada Elisa viajou de imediato para a Argentina para o acompanhar e nunca mais deixou de estar ao seu lado. A 16 de Fevereiro, Malori estava finalmente estável para viajar para Espanha, ingressando numa clínica em Pamplona. Então estava plenamente convencido que seria operado ao ombro -já começava a mover a perna - e que voltaria rapidamente aos treinos para em Março estar novamente a competir. Mas o seu mundo desabou quando o médico lhe explicou que não seria operado ao ombro. "O problema que tens no teu ombro é que o teu cérebro desconectou-se da parte direita do corpo", disse-lhe o médico. Malori reagiu com desespero: "Estive a chorar durante mais de uma hora sem parar, até à exaustão, depois de ouvir aquelas palavras."

Era o momento da verdade para Adriano Malori. O italiano sabia que ou reagia ou a sua carreira podia muito bem terminar ali se se deixasse derrotar pelo negativismo. Com 16 vitórias como profissional, Malori é um especialista do contra-relógio e um dos homens de confiança da Movistar desde 2014.

A 25 de Fevereiro, o italiano, com parte do corpo paralizado, ingressou no centro especializado para recuperações de casos neurológicos. A 28 de Abril saiu pelo próprio pé e até andou um pouco de bicicletas dias antes. Regressou a Itália, procurando o conforto caseiro, mas cedo percebeu que o centro onde estava a continuar a sua recuperação não era o mais adequado. "Ali trabalham casos mais extremos, de pessoas que não podem aspirar a uma recuperação total, mas 'apenas' querem ser pessoas normais. Eu já tinha voltado a sê-lo. O que eu queria voltar a ser era um desportista profissional", salientou. A opção foi voltar a Espanha, passando duas semanas nesse país e uma em casa.

Apesar da vontade de recuperar, nem tudo foi fácil. Malori admitiu que não conseguiu ver uma etapa do Giro e do Tour. Disse que nessas alturas nem parecia que era o seu desporto. Uma boa parte do dia passava em reabilitação e no Verão casou com Elisa.

A grande surpresa foi quando no final de Agosto Malori anunciava que estava de volta e o italiano espera que a sua história de superação possa ser um exemplo para outros: "Que alguém passe o que eu passei e em oito meses volte a competir, não a treinar, mas a competir... é uma coisa extraordinária, é um milagre. Tinha de contar a toda a gente."

A história de Malori atravessou fronteiras. Um exemplo de como a vontade e a dedicação podem contrariar diagnósticos. Porém, o ciclismo pode ser bastante ingrato e foi o que aconteceu. Nas cinco corridas em que participou não completou nenhuma, mas não era isso que se pedia. Malori apenas tentava recuperar a sensação de ser um ciclista. No entanto, na Milano-Torino, um buraco voltaria a obrigá-lo a uma ida ao hospital. Desta vez foi um colega Rubén Fernández quem o atingiu, provocando a queda de Malori e também a Michele Scarponi (Astana). Malori ficou ali, estendido no chão, provavelmente a pensar como o azar o persegue.

Ao regressar à competição Malori garantiu que não sentia medo, algo comum nos ciclistas quando são vítimas de quedas aparatosas e com danos tão graves como a do italiano. Psicologicamente há sempre algo que pode ser difícil de recuperar. Malori parecia estar a conseguir o impossível. Uma clavícula partida, resultado deste último acidente, é das lesões que mais acontecem no ciclismo, mas muito mais do que mais uma recuperação física, a questão é se o italiano vai não só demonstrar força de vontade para uma nova recuperação, mas também se nas corridas as poderá encarar sem ser perseguido por um 2016 que tanto foi azarado, como o ano de uma das histórias incríveis do desporto.

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