30 de maio de 2016

Um balanço para curar a "ressaca"

(Fotografia: giroditalia.it)
Depois de três semanas intensas de ciclismo, com muito espectáculo, emoção, e indecisão até final, entra-se numa fase de uma espécie de ressaca. Foram tantas horas de ciclismo que agora é preciso habituar-nos ao ritmo normal do dia-a-dia sem transmissões, repetições e, claro, o recorrer à internet para ver declarações, reportagens e outras novidades.

E o efeito é ainda pior quando se assistiu a ciclismo de tanta qualidade. A Volta a Itália pode não ter tido Alberto Contador, Chris Froome ou Nairo Quintana. Nibali e Valverde lideraram a lista de ciclistas de primeira linha, mas nesta edição ficou confirmado que a modalidade tem novos protagonistas: Steven Kruijswijk, Johan Esteban Chaves, Ilnur Zakarin e Bob Jungels.

A postura com que os ciclistas enfrentaram a competição contribuiu para o espectáculo. Foi um Giro de ataque. Uns mais calculados que outros, mas ninguém teve medo de se mostrar. A lamentar apenas o abandono precoce de Mikel Landa que poderia ter animado ainda mais a luta na estrada. Mas o que importa é quem lá ficou e esses merecem todo o reconhecimento.

(Fotografia: giroditalia.it)
Vincenzo Nibali ficará para a história como muito mais do que o vencedor. O italiano da Astana será recordado como alguém perseverante, que quando já praticamente todos o colocavam fora da batalha, ele recuperou física e animicamente e que soube aproveitar as adversidades de outros para concretizar um autêntico milagre.

Com esta vitória colocou-se numa posição muito forte nas negociações na muito falada mudança para a recém-confirmada equipa do Bahrain. Renovar com a Astana estará cada vez menos no panorama futuro do Tubarão.


Giro d'Italia 2016 - Stage 21 - Inteviews por giroditalia

As lágrimas de Nibali quando se recolocou na luta, são um dos momentos deste Giro. O mais marcante foi a queda de Kruijswijk, naquela dramática 19ª etapa. Este holandês (28 anos) - que merecia pelo menos o pódio - passou uma mensagem importante à Lotto-Jumbo: é importante dar-lhe uma equipa, pois ele está preparado para ganhar uma grande volta, principalmente um Giro ou Vuelta, e a sua exibição não parece ter sido algo único. Teremos a possibilidade de comprovar isso mesmo na Volta a Espanha.

Quanto a Chaves (26 anos), o pequeno colombiano foi contratado pela Orica-GreenEDGE precisamente para iniciar o processo de mudança da equipa, que quer apostar mais nas três semanas, do que apenas em clássicas, sprints ou contra-relógios. Porém, a Orica pareceu ter sido apanhada algo desprevenida com a performance de Chaves. Com um contra-relógio fraco e sem grandes ataques nas montanhas, o top dez era enfrentado como o possível e o esperado. No entanto, o colombiano foi mais longe e acabou com a camisola rosa a cair-lhe no colo. Tal como Kruijswijk, Chaves tem que exigir ter uma equipa mais forte na sua protecção. Também ele está pronto para lutar pela vitória e apresenta-se desde já como um dos candidatos a ter em conta na Vuelta.

Bob Jungels andou de rosa e venceu a classifcação
da juventude (Fotografia: giroditalia.it)
Bob Jungels é o mais novo dos três (23) - foi o vencedor da classificação da juventude - e ainda tem uma margem de progressão a cumprir até conseguir apresentar-se como verdadeiro candidato. Ainda assim, a Etixx-QuickStep confirmou que contratou um ciclista com um futuro promissor nas grandes voltas. Neste momento está escalado para ir ao Tour.

Ilnur Zakarin não terminou o Giro devido a uma queda na tal 19ª etapa, mas o russo tinha o top dez assegurado e ainda aspirava ao pódio. Só não lutava por mais porque teve um contra-relógio para esquecer: caiu duas vezes. O russo é o futuro da Katusha e nesta altura ainda não se sabe se estará no Tour ou na Vuelta.

Alejandro Valverde esperou até aos 36 anos para se estrear no Giro. A liderança bipartida da Movistar no momento em que Andrey Amador se apresentou tão bem que chegou a vestir a camisola rosa, não foi benéfica para Valverde. Mais uma vez, esta divisão provocou demasiada indecisão na estratégia da equipa. Também não ajudou o espanhol continuar a não se dar bem com altitudes que passem os 1500/2000 metros. Ainda assim, aquela característica de lutador, de nunca dar nada por perdido, valeu a Valverde o lugar no pódio e uma vitória de etapa. Apesar de tudo, um excelente resultado. E o espanhol já pode dizer que esteve no pódio das três grandes voltas, tendo vencido em Espanha.

Como desilusões, destaque para Rafal Majka. O ciclista da Tinkoff até terminou na quinta posição, o que é sempre um resultado positivo numa grande volta. Porém, o polaco pouco ou nada se viu. Não atacou, nem pareceu muito determinado em tentar mostrar-se. Limitou-se a tentar andar com os melhores, numa ambição muito limitada para um ciclista de quem a equipa certamente esperava mais.

Também Tom Dumoulin acabou por não confirmar as expectativas criadas na Volta a Espanha. Venceu o contra-relógio inicial, andou de rosa, chegou a dizer que o tinham percebido mal quando pensaram que não lutaria pela vitória. Mas mal o terreno inclinado chegou, o holandês da Giant-Alpecin falhou e acabou por desistir.

Ainda assim, serão a Cannondale e a AG2R que estarão mais desiludidas. No primeiro caso, Rigoberto Uran fez uma boa terceira semana, mas a segunda foi tão má que já se levantam questões sobre se o colombiano irá alguma vez repetir a forma de 2013 e 2014, anos em que terminou em segundo. A Cannondale pode não ter a equipa mais forte, mas ainda assim estava toda preparada para apoiar o colombiano que, graças aos resultados da terceira semana, conseguiu um top dez (sétimo). Ainda assim, deve saber a pouco para a equipa americana.

Já a AG2R levou as mãos à cabeça com o descalabro de Domenico Pozzovivo na derradeira etapa de montanha, no sábado. O top dez parecia estar mais ou menos garantido, mas tombou para 20º. Aos 33 anos, o italiano pode começar a perder crédito na equipa e em final de contrato, Pozzovivo está pressionado a alcançar resultados. Terá o objectivo de se mostrar no Tour.

Também John Darwin Atapuma procura mostrar serviço, mas à BMC. Durante quase toda a corrida ninguém se lembrava que o ciclista estava sequer em prova. Porém, nas últimas etapas de montanha apareceu com vontade de ganhar uma. Foi um animador que não conseguiu a vitória, mas alcançou um surpreendente nono lugar e é um resultado que lhe permitirá negociar a renovação.

E os colombianos continuam a dar muito que falar no Giro - assim tem sido nos últimos anos -, mas houve um que deu força às dúvidas sobre a sua contratação por parte da Movistar. Carlos Betancurt deu muitas dores de cabeça à AG2R que preferiu dispensá-lo, mas a equipa espanhola acredita que pode recuperar um ciclista que todos reconhecem talento. Betancurt viu-se durante um curto ataque na segunda semana e desistiu na 19ª etapa. Muito pouco.

O representante português

André Cardoso foi o único português em prova e merece mais uma vez todo o reconhecimento do excelente companheiro de equipa que é e que, mesmo a trabalhar para o líder, consegue constantemente terminar no top 20. Foi 14º a 34:12 minutos de Nibali. É um ciclista que a Cannondale sabe sempre que pode contar com ele, mas é impossível não pensar o que poderia Cardoso fazer com um bocadinho de liberdade.

Os outros primeira linha e uma polémica para terminar

Nibali e Valverde não eram os únicos grandes nomes. Eram os que lutariam pela geral. Mas quando se fala de sprinters, então estiveram em Itália alguns dos maiores nomes. À cabeça, Marcel Kittel e André Greipel. E os alemães dominaram as etapas ao sprint. Todas. Matteo Trentin (Etixx-QuickStep) foi o único sprinter italiano a vencer... numa etapa de média montanha! Este triunfo foi também ele um dos grandes momentos do Giro.

Giacomo Nizzolo pensou por minutos que tinha finalmente conquistado a sua primeira etapa numa grande volta, mas a subida ao pódio em Torino para receber a camisola vermelha - que a certa altura parecia que ninguém a queria - foi tão amarga, pois foi desclassificado por ter "tapado" Sacha Modolo e Nikias Arndt (a Giant começou e acabou a ganhar) foi declarado o vencedor. Mais um alemão... A armada italiana de sprinters foi uma desilusão.

A equipa do Giro e a outra revelação

A Astana pode ter conquistado a classificação das equipas, mas o destaque vai todo para a Ettix-QuickStep: quatro vitórias de etapa, três homens a vestirem a camisola rosa e um top dez. O conjunto belga foi muito além do que esperava. E na altura que Gianluca Brambilla vestia orgulhosamente a maglia rosa, um outro nome surgia: Primoz Roglic (Lotto-Jumbo). O esloveno perdeu a primeira etapa para Dumoulin por centésimos, mas no contra-relógio de 40,5 quilómetros venceu, mostrando que é mais um ciclista a ter em conta para esta vertente,mesmo tendo beneficiado da chuva que afectou quem partiu mais tarde. E foi a primeira vez que fez um tão longo...

A Sky e a infelicidade do Giro

Mikel Nieve venceu a classificação da montanha

(Fotografia: giroditalia.it)
A equipa britância não se dá bem com o ares italianos. Este ano apostou forte em Mikel Landa, mas uma gastroenterite mandou o espanhol para casa muito cedo. Na esperança de ainda conseguir recuperar Landa, Nieve perdeu muito tempo à espera do seu líder, uma escolha que acabaria por custar uma segunda opção à Sky.

Se a liderança bipartida não é solução, como mostrou a Movistar, não ter um plano B também pode custar caro. E equipas como a Sky podem dar-se ao luxo de ter um ciclista que assuma a liderança se algum imprevisto acontecer. Mikel Nieve conquistou uma etapa e a camisola da montanha e andou bem nas tiradas decisivas. Ficou a sensação que poderia ter feito algo mais se não tivesse sido obrigado a perder tempo.

Veja aqui as classificações da 99ª edição do Giro.

Será uma Volta a Itália com vários momentos para recordar, mas talvez tenha faltado um: Fabian Cancellara não conseguiu a desejada camisola rosa, tendo sido a primeira vítima de uma gastroenterite que afectou alguns ciclistas. Em ano de despedida, ter-lhe-ia ficado bem.

Agora inicia-se a contagem decrescente para a Volta a França e, até lá, haverá muito ciclismo para curar esta ressaca.

29 de maio de 2016

Nibali provou que os milagres acontecem

(Fotografia: giroditalia.it)
Não foi qualquer intervenção divina. Foi até bem terrena, bem humana. Foi o erro de um homem e o acreditar e sacrifício de outro que permitiu que um milagre acontecesse na Volta a Itália. O desporto tem destes momentos e parte da beleza do ciclismo é isto mesmo: indecisão, surpresas, um pequeno pormenor e tudo muda. Pelo meio, muito espectáculo e uma missão impossível que foi concretizada e comprovou que nesta modalidade há que acreditar até ao fim.

Vincenzo Nibali chegou a este Giro como o principal favorito de um trio que incluía um estreante veterano Alejandro Valverde e uma das grandes promessas espanholas para as três semanas, Mikel Landa. O percurso parecia assentar-lhe na perfeição. As subidas eram duras, mas ao seu jeito e tinha muitas descidas, dando a Nibali muitas opções de atacar, várias tácticas a explorar. Os contra-relógios também era ao estilo do italiano.

Era o regresso do filho pródigo depois de um ano em que perdeu estatuto na Astana para Fabio Aru, agora o preferido da equipa cazaque para ir ao Tour. O incidente na Vuelta que lhe valeu a expulsão (foi puxado por um carro) mancharam a reputação de um ciclista que nem sempre aparece ao seu melhor, quando enfrenta os melhores, mas que quando se trata de lutar, não vira a cara a um bom desafio. Precisamente aquele que enfrenta na carreira aos 31 anos.

Voltar a competir no Giro foi uma espécie de restart. Nibali precisava de recuperar a motivação e também algum prestígio perdido e que a vitória na Volta à Lombardia, no final de época em 2015, esteve longe de o fazer.

Por momentos, tudo parecia desmoronar-se. Nibali fraquejou em etapas de montanha e na crono-escala não ajudou ainda ter problemas mecânicos. Tinha 4:43 minutos de desvantagem antes das duas etapas decisivas, além da incerteza se continuaria em prova. Os exames médicos terão sido claramente positivos. Seja lá o que foi que não permitiu Nibali estar no seu melhor, ficou para trás quando primeiro viu Valverde ceder e o pódio tornou-se possível e depois a queda do que até então estava a ser um super Steven Kruijswijk.

Começou por tirar os dois do seu caminho, mas sobrou Johan Esteban Chaves, que na derradeira etapa de montanha nunca pareceu ter realmente hipótese de fazer frente a um Nibali renascido e que assim garantiu o seu segundo Giro e a quarta grande volta. Em dois dias passou de 4:43 de desvantagem, para 52 segundos à frente.

Em três semanas viu-se o pior de Nibali e o melhor. E agora? A vitória dar-lhe-á de novo algum estatuto, principalmente em não ter de ajudar Aru no Tour, podendo talvez apontar à Vuelta. Se tivesse perdido, poderia ter sofrido a humilhação de ser o braço-direito de um colega de equipa que é mais um rival. Um dos objectivos é o ouro Olímpico e o triunfo no Giro permite-lhe recuperar alguma da confiança eventualmente perdida.

E depois há a questão do contrato. Nibali termina este ano com a Astana e tudo indica que está de partida. Vinokourov apressou-se a dizer que espera que o italiano pondere renovar. Politicamente correcto? Talvez. A relação entre os dois já teve melhores dias e Nibali estará mesmo com vontade de mudar de ares. O triunfo no Giro dá-lhe poder de negociação e se realmente se confirmar a criação da equipa do Bahrain, haverá muitas pedidos a aceder para contar com o Tubarão, pois outros conjuntos não se importarão nada em contratar o italiano.

Demasiado para Chaves, desilusão para Kruijswijk, alegria para Valverde

Era uma oportunidade única que quase lhe caiu no colo, mas Chaves (Orica-GreenEDGE) não demorou muito a mostrar que não tinha capacidade para controlar Nibali. Na 20ª etapa, com três contagens de primeira categoria e uma de terceira na meta em Sant'Anna di Vinadio, foi preciso esperar pelos últimos 18 quilómetros dos 134 quilómetros para finalmente ver Nibali atacar e deixar Chaves para trás. Nem a ajuda de Rigoberto Uran (compatriota, mas da Cannondale) salvou Chaves. Ele sabia, de tal forma que foi um honrado perdedor: "É só uma corrida de bicicletas." E ainda vamos muito deste colombiano em provas de três semanas, principalmente quando a Orica tiver ciclistas para o apoiar.

Quanto a Valverde (Movistar), aproveitou que Steven Kruijswijk (Lotto-Jumbo) dificilmente poderia fazer melhor com uma costela fracturada e dores num pé. O espanhol conseguiu um pódio que celebrou como uma vitória. Já o holandês apresentou um discurso mais motivador do que na sexta-feira, dia em que era um homem assustadoramente derrotado. Kruijswijk pode acreditar: tem  potencial para ganhar uma grande volta. É impossível não sentir alguma injustiça com este resultado. Estava tão forte até àquela queda...

Quanto ao restante top dez, estava reservada uma última surpresa, com Atapuma (BMC) a entrar para o nono lugar, enquanto Pozzovivo (AG2R) tombou para vigésimo. Majka, Jungels (vencedor da classificação da juventude), Amador, Uran e Siutsou fecharam os dez primeiros.

Vitória na etapa para Taaramäe (Fotografia: giroditalia.it)
O vencedor da etapa foi um Rein Taaramäe que salvou o Giro à Katusha com uma vitória no dia a seguir à desistência de Ilnur Zakarin (devido a queda), que caminhava para terminar no top dez.

Também Mikel Nieve tem razões para festejar. A Sky acabou por perder Landa antes do "verdadeiro" Giro começar, mas o espanhol venceu uma etapa e roubou a camisola azul da  montanha a Damiano Cunego (Nippo - Vini Fantini), que muito trabalhou para a conquistar, mas foi mais um que não aguentou a dureza da tirada.



Giro d'Italia 2016 - Stage 20 highlights por giroditalia

Etapa 21: Cuneo - Turim (163 quilómetros)



Ainda falta uma etapa. É a de consagração para Nibali, mas os sprinters têm uma última oportunidade para vencer e Giacomo Nizzolo (Trek-Segafredo) e Sacha Modolo (Lampre-Merida) estarão desesperados para ganhar. E o primeiro veste a camisola vermelha da classificação dos pontos.

Serão 163 quilómetros sem dificuldades, com um circuito final de 7,5 que será feito oito vezes. É a primeira vez que Turim recebe o final da Volta a Itália.


Giro d'Italia 2016 - Stage 21 por giroditalia

28 de maio de 2016

Acabaram-se os prognósticos. Mostrem o que valem

(Fotografia: giroditalia.it)
Nesta Volta a Itália não há previsões que resistam. Não há conhecimento da modalidade que resista. Este Giro é simplesmente louco. O que parece num dia, não é no outro. Não há vantagens que sejam seguras, não há camisola rosa garantida... até este sábado. Tem tudo para ser uma penúltima etapa épica e é, provavelmente, o único prognóstico possível de se fazer. Quanto ao que se vai passar... É a indefinição total e neste Giro a tendência tem sido para grandes surpresas. Será que a 21ª tirada nos reserva uma última?

Não se faz um balanço antes do final, mas uma coisa se pode dizer: a Volta a Itália está a ser espectacular. É tudo o que se pede para uma prova de três semanas. Luta até ao fim, trocas de liderança, vencedores e recuperações inesperadas. Mas falta uma etapa para decidir quem conquista entre memorável Giro, quem no domingo terá a sua consagração.

Como uma queda muda tudo

Até à subida do Colle dell'Agnello tudo se encaminhava para mais uma demonstração da superioridade de Steven Kruijswijk. O holandês da Lotto-Jumbo estava confortável mesmo a subir até o ponto mais alto da Volta a Itália - 2744 metros - e até estava a deixar para trás a ameaça de Alejandro Valverde (Movistar). Como uma queda muda tudo...

Foi aparatosa - com direito a um mortal - e com efeitos dramáticos para Kruijswijk.


O holandês não conseguiu recuperar o tempo perdido. Demorou a recuperar a sua bicicleta e acabou por trocá-la. Foi este o momento que Kruijswijk precisava da sua equipa... Nem vê-la. Com três minutos de vantagem para Johan Esteban Chaves, Kruijswijk acabou o dia em terceiro e a 1:05. Recuperável, é certo, mas mais do que o tempo que perdeu, será decisivo o moral que desapareceu e um corpo com marcas da queda.

"Perdi o Giro. F*** tudo. Foi um erro estúpido na descida. Lixei tudo. Estava no meu limite no topo e queria alimentar-me e beber algo. Estava a seguir os outros, mas cometi um erro e acabei no monte de neve." O ciclista nem tentou esconder a sua desilusão e frustração. E continuou: "Sinto que magoei as minhas costelas e as minhas costas. No final estava com muitas dores. O meu moral está desfeito. Tentei dar tudo, mas o meu corpo dói-me muito e, por isso, acabou."


(Fotografia: giroditalia.it)
Recuperar a confiança em poucas horas é por si só uma missão difícil, ainda mais quando o holandês é claramente um homem derrotado. Porém, o dia ainda piorou. Exames médicos determinaram que Kruijswijk tem uma costela fracturada e o ciclistas queixa-se de dores no pé. Só de manhã se saberá se o holandês vai tentar recuperar a camisola rosa. A hipótese de abandono não foi afastada, pois apesar de ser uma etapa curta, 134 quilómetros, serão quatro contagens de montanha pela frente.

Mostrando ser claramente o homem mais forte até ao momento da queda, já é triste ver Kruijswijk perder desta forma, mas será terrível se nem acabar um Giro que tinha tudo para ser seu.

Chaves recebeu o brinde

O colombiano ia dando indicações que o segundo lugar já lhe agradava, mas a desgraça de Kruijswijk permitiu a Johan Esteban Chaves chegar à camisola rosa, com 44 segundos de vantagem sobre Vincenzo Nibali. É o sétimo líder do Giro, mas corre um sério risco de o ser apenas por um dia.

A grande questão é: estará a Orica-GreenEDGE preparada para defender uma liderança? Chaves estava no Giro com aspirações a um top dez, talvez um pódio, mas dificilmente a equipa australiana pensava que poderia chegar à vitória. O colombiano foi contratado para isso mesmo, mas a Orica ainda não tem um conjunto para proteger um líder nas três semanas.

Para agravar, o colombiano fraquejou na última subida do dia, deixando Nibali recuperar muito tempo e não é a primeira vez neste Giro que o vemos sem capacidade para andar ao ritmo dos melhores, apesar de estar a realizar uma prova excelente. É o momento para Chaves se transcender se quiser ganhar a Volta a Itália.

O derrotado e o azarado

Se Kruijswijk sente-se derrotado, Valverde não se pode sentir muito melhor. Grande altitude não é com o espanhol. Não foi a primeira vez que o vimos sofrer acima dos 1500/2000 metros. Saiu do pódio e está a 1:48 do líder. Poderá ainda ficar nos três primeiros, ainda mais com a dúvida sobre a condição física de Kruijswijk. Até poderá ganhar, porque não, afinal os milagres parecem ser possíveis no Giro. Que o diga Nibali!

O azarado é mesmo Ilnur Zakarin. O ciclista russo da Katusha estava também ele a realizar uma excelente Volta a Itália. As duas quedas no contra-relógio de 40,5 quilómetros - feito debaixo de chuva - colocaram-no fora da luta pela vitória, mas Zakarin ainda não tinha desistido da ideia de chegar ao pódio. Esta sexta-feira teve também ele uma queda aparatosa. Foi parar fora da estrada e assustou. Abandonou, mas fisicamente foi "apenas" uma clavícula partida.

Aí está Nibali


(Fotografia: giroditalia.it)
A 4:43 minutos do líder, qualquer coisa mais que talvez chegar ao pódio - que estava a 1:20 de distância - ou uma vitória de etapa, tinha contornos de milagre. Nem se sabia se Vincenzo Nibali partiria, visto que tinha recebido os resultados dos exames médicos na noite anterior. Partiu, ainda vacilou no Colle dell'Agnello, mas no momento em que percebeu que Valverde estava a ficar para trás, o italiano começou a transformar-se. E a transformação ficou completa quando soube da queda de Kruijswijk.

A Astana até tinha começado o dia com o objectivo de ganhar a etapa com Michele Scarponi. Não podem só dizer que era táctica ter o veterano ciclista na frente, pois com mais de quatro minutos de vantagem, quase que parou para esperar por Nibali. Mas aquela queda mudou mesmo tudo. De repente, Nibali pedalava para ganhar o Giro e era notório que ganhar a etapa era apenas um bónus. A forma como subiu a primeira categoria até à meta em Risoul era de um homem determinado. Um homem com uma missão.

No final, a emoção tomou conta de Nibali, que ainda na sua bicicleta, chorou e libertou toda a tensão que claramente se apoderava dele, depois de momentos em que claudicou e pareciam ter terminado com a possibilidade de vencer o Giro.


Le lacrime di Nibali dopo l'impresa di Risoul por giroditalia

Afinal, os milagres podem acontecer, mas o Tubarão terá de este sábado de voltar a atacar como se não houvesse amanhã... que não há mesmo. É agora ou nunca para assinar uma recuperação que, a acontecer, terá tanto de inesperada como de memorável.


Giro d'Italia 2016 - Stage 19 highlights por giroditalia

Confira os resultados da etapa e as classificações.

Etapa 20: Guillestre - Sant' Anna di Vinadio (134 km)



Não é muito normal nos últimos anos chegar à etapa decisiva de uma grande volta com quatro ciclistas ainda com hipótese de ganhar. Vamos incluir Valverde, porque perante tudo o que aconteceu neste Giro, há que acreditar que tudo é possível.

Serão quatro montanhas, três de primeira categoria e uma de terceira para terminar. Duas delas ultrapassam os dois mil metros de altitude, a outra fica lá perto. A descida depois do Col de la Bonette será longa e exigirá muita atenção, ainda que a última do dia, mesmo sendo mais curta, não será menos difícil. As pendentes médias das três subidas de primeira categoria rondam os 6/7%, mas, como não podia deixar de ser, têm metros acima dos 10%. O pelotão não terá facilidades e os ataques poderão surgir a qualquer momento.

É o grande final. E pede-se algo épico para terminar em grande esta fantástica Volta a Itália.


Giro d'Italia 2016 - Stage 20 por giroditalia

27 de maio de 2016

As decisões começam... com Nibali a decidir se fica ou se abandona

(Fotografia: giroditalia.it)
Três semanas à espera deste momento. Na quinta-feira os candidatos "aqueceram os motores" para hoje e no sábado enfrentarem duas das mais difíceis etapas do Giro. Porém, as decisões vão começar ainda antes do pelotão se fazer à estrada. A presença de Vincenzo Nibali à partida é uma incógnita.

O italiano da Astana realizou exames médicos ontem de manhã e estava previsto ter os resultados à noite. A equipa e o ciclistas procuram respostas para as dificuldades que Nibali tem enfrentado nas etapas mais complicadas, nas quais tem claudicado, tendo arruinado a possibilidade de conquistar a sua segunda Volta a Itália.

"Vamos analisar com calma e decidir", referiu Giuseppe Martinelli, director desportivo da Astana. Já Nibali deu um sinal que terá intenções de seguir até final: "As minhas pernas estão bem, quem sabe." Na chegada a Pinerolo, o italiano até tentou atacar, ainda que sem sequer assustar os adversários, mas sempre mostrou que ainda não está pronto a atirar a toalha ao chão.

A precisar de um milagre para ganhar o Giro, caso continue em prova, a questão será se Nibali vai tentar o pódio, apostar numa etapa... as duas coisas. A forma que apresenta não parece indicar que possa ter demasiados objectivos, mas de orgulho ferido, o italiano ainda quer conquistar algo.

Porém, sem estar ao seu melhor será difícil. É que a juntar aos problemas físicos, a questão psicológica poderá estar a ter a sua influência. O facto de ter perder protagonismo na Astana para Fabio Aru e com o contracto a chegar ao fim, Nibali poderá estar a sentir-se pressionado para alcançar resultados. Para (não) ajudar, as constantes distracções com as notícias que está a caminho de uma nova equipa com sede no Bahrain.

Esta quinta-feira o site Cycling Weekly publicou que Nibali vai mesmo liderar o conjunto criado pelo príncipe Nasser bin Hamad Al Khalifa. Com um orçamento a rondar os 15 a 18 milhões de euros - mais baixo do que a Sky (24 milhões), o italiano quererá levar Alessandro Vanotti e Valerio Agnoli, o massagista Michele Pallini, o treinador Paolo Slongo e o director desportivo Giuseppe Martinelli. O site avança ainda que o ciclista terá tentado convencer Nicholas Roche, com quem a Sky quer renovar.

Com tanta época ainda pela frente, Nibali terá de enfrentar muitas distracções e saber contorná-las para tentar cumprir o outro grande objectivo do ano: os Jogos Olímpicos. Mas para já, só quer descobrir se tem algum vírus que o esteja a afectar.

Kruikswijk pronto para os Alpes


O top dez chegou todo junto a Pinerolo (Fotografia: giroditalia.it)
O holandês voltou a mostrar-se forte na etapa mais longa do Giro. E nem precisava, mas Steven Kruijswijk parece não conseguir resistir. Defendeu-se de qualquer pequeno ataque (e foram todos mesmo pequenos) e chegou ao ponto de se colocar na frente do grupo de favoritos e marcar o ritmo. Mete respeito e desanima quem ainda ambiciona o destronar.

O pelotão parece começar a render-se à forma do holandês, o que não significa que nestas duas próximas etapas Kruijswijk possa ficar descansado. E sem uma equipa a protegê-lo, vão ser quilómetros de muito trabalho e sofrimento. Mas há que salientar que nesta quinta-feira Enrico Battaglin esteve muito bem, comprovando que a camisola rosa não motiva apenas quem a veste, mas também quem tem a missão de a proteger.

Johan Esteban Chaves (a 3:00 minutos) dá indicações que o segundo lugar já o satisfaz e poderá estar mais preocupado em não perdê-lo e talvez ganhar uma etapa. Já Alejandro Valverde quer mesmo mais. A vitória numa tirada está feita e mesmo a 3:23, o espanhol da Movistar vai testar Kruijswijk ao limite... A ver vamos se não sofre um contra-ataque...

Nibali (a 4:43), Ilnur Zakarin (a 4:50) e Rafal Majka (5:34) ainda apontam ao pódio, enquanto do sétimo lugar para baixo a luta é pelo top dez. E salvo um dia muito mau, até já pode estar definido com Bob Jungels (Etixx-QuickStep), Andrey Amador (Movistar), Domenico Pozzovivo (AG2R) e Kanstanstin Siutsou (Dimension Data).

Etapa 19: Pinerolo - Risoul (162 km)



A subida ao Colle dell’Agnello é um dos momentos mais aguardados. O ponto mais alto do Giro está a  2744 metros e rodeado de muita neve e, claro, frio. O pelotão poderá enfrentar um dia muito difícil, pois a julgar pelas imagens que estão a ser partilhadas nas redes sociais, será como passar por um Inverno rigoroso, depois de nestas três semanas já ter apanhado dias de sol maravilhosos e também dias de muita chuva.



Serão mais de 21 quilómetros a subir e a fase mais difícil terá 9,5% de média e uma pendente máxima de 15%. O vencedor da etapa conquistará o troféu Vincenzo Torriani, que desde 1996 homenageia o histórico organizador da competição e que é dado na tirada que tem o ponto mais alto do Giro. Atenção à descida. Com a possibilidade da neve estar a começar a derreter, o asfalto poderá estar bastante perigoso. A tirada termina numa primeira categoria.




A 19ª etapa marca ainda a visita a França, na segunda "saída" do Giro que começou na Holanda. E os organizadores não se podem esquecer: a mascote tem de ficar em Itália. É que uma associação considerou ser de mau gosto se o lobo atravessar a fronteira devido aos problemas que os pastores franceses têm tido com estes animais, com muito gado a ser morto nos últimos meses.


Giro d'Italia 2016 - Stage 19 por giroditalia

A perfeição e companheirismo da Etixx-QuickStep

Momento do sprint. Trentin surpreendeu Moser (Fotografia: giroditalia.it)
Tudo o que falhou nas clássicas - as tácticas, as formas físicas dos ciclistas - no Giro tudo sai bem. Pode não ganhar qualquer classificação, mas quando se analisa tudo o que a equipa belga alcançou nesta Volta a Itália, inevitavelmente colocará a Etixx-QuickStep como um dos grandes destaques da 99ª edição, independentemente do que aconteça nas três etapas que faltam.

Na 18ª etapa, a mais longa do Giro com 244 quilómetros, a Etixx esteve tacticamente perfeita ao colocar dois ciclistas na frente, ao ter Gianluca Brambilla fugido com Moreno Moser e depois ajudou ter um super Matteo Trentin, que fez uma recuperação espectacular nos últimos metros para ganhar a tirada em Pinerolo. Foi a quarta vitória da equipa, depois das duas de Marcel Kittel e a de Brambilla. A estes triunfos junta-se três ciclistas que já vestiram de rosa - Kittel, Brambilla e Bob Jungels (que poderá terminar no top dez) - e o sprinter alemão também liderou a classificação por pontos.

Para uma equipa que aposta forte nas clássicas e que nas grandes voltas tem o objectivo de ganhar etapas, o director desportivo Patrick Lefevere certamente que estará a pensar: missão cumprida no Giro. Resultados muito importantes depois da Etixx ter falhado nas clássicas. E veremos se a equipa fica por aqui...

Outro aspecto a salientar é a forma como a Etixx funciona de facto como um conjunto unido. Se houvesse um prémio para o melhor colega, Brambilla era um vencedor certo. Mais uma vez o italiano sacrificou a possibilidade de ele próprio ganhar, para garantir que a equipa ficava com o triunfo que foi para Trentin.

Explicação: Brambilla estava isolado com Moreno Moser (Cannondale) à entrada do último quilómetro. Colocou-se na roda do compatriota, olhando de vez em quando para trás para garantir que ninguém se estava a aproximar. Parecia que a discussão era entre os dois italianos, até que, inesperadamente, aparece um terceiro, Trentin, lançado, a fazer um esforço descomunal para chegar à frente. Brambilla vê o colega e decide que nada fará para ajudar Moser a ficar na frente e talvez a ganhar a tirada (Moser teria provavelmente sido mais forte no sprint).

Trentin nem hesitou. Passou directo. Será que Moser viu Trentin? O ciclista da Cannondale poderá ter sido surpreendido, pensando que a única camisola azul que estava atrás de si era a de Brambilla.

Recuando à etapa 10, Brambilla vestia a camisola rosa, uma conquista que muito o orgulhou. Porém, ao aperceber-se que não tinha capacidade para a defender, sacrificou-se na ajuda a Bob Jungels de forma a assegurar que a liderança continuaria na equipa. E conseguiu.

Os ciclistas da equipa belga têm uma pulseira cor-de-rosa que lhes foi oferecida por Marcel Kittel, para os motivar a ajudá-lo a vestir a maglia rosa. Não o voltarão a fazer, mas sendo o rosa a cor da vitória no Giro, a pulseira assenta-lhes muito bem. Tal como Brambilla, Trentin conquistou a sua primeira vitória de sempre nesta competição e não deixa de ter um toque de ironia que um sprinter italiano finalmente tenha vencido... numa etapa de média montanha.

E se a Etixx até é conhecida por ter dois corredores na frente e ainda assim perder a corrida, pode-se dizer que talvez tenha dado esta quinta-feira um primeiro passo para recuperar do "trauma"!

Confira o resultado da etapa e as classificações.


Giro d'Italia 2016 - Stage 18 - HIghlights por giroditalia

26 de maio de 2016

Uma vitória para a despedida da IAM. E agora que comecem as decisões

(Fotografia: giroditalia.it)
Uma etapa entre etapas. Os 196 quilómetros entre Molveno e Cassano D'Adda foram um intervalo nas etapas emocionantes que se têm sucedido desde sexta-feira. Foi decidida num estranho sprint que viu mais um alemão ganhar. Os italianos, principalmente Giacomo Nizzolo, já não sabem o que fazer para ganhar uma etapa no Giro. Já Roger Kluge venceu pela primeira vez numa grande volta, um triunfo alcançado dias depois do anúncio do fim da IAM. Um excelente cartão de visita para quem está à procura de equipa para 2017.

Porém, o que mais se quer é regressar às etapas de montanha. Vêm aí as três decisivas. Steven Kruijswijk (Lotto-Jumbo) contra... todos, ainda que as principais ameaças venham de Johan Esteban Chaves (Orica-GreenEDGE) e Alejandro Valverde (Movistar). Mas os ataques vão ser de mais ciclistas, pois há quem ainda sonhe em aproveitar um eventual dia mau do holandês. Vincenzo Nibali (Astana) e Ilnur Zakarin (Katusha) lideram esta lista. O pódio não está fechado, o top dez muito menos. Ainda há muito por decidir.

Kruijswijk vai transmitindo um discurso de confiança, que até ao momento se tem reflectido na estrada. Será que está preparado para os testes finais?

Esta quinta-feira a etapa será para "aquecer os motores". Entre Muggiò e Pinerolo são 244 quilómetros, 170 planos. Depois haverá uma segunda categoria, em Pramartino, que poderá dar ideias a alguém para atacar. Seguem-se 20 quilómetros praticamente sempre a descer até à meta.



Em circunstâncias normais, poder-se-ia dizer que é uma etapa muito atractiva para Vincenzo Nibali. Porém, perante as últimas exibições, é mais provável ver Valverde tentar a sua sorte, já que também desce muito bem. Atenção a Diego Ulissi (Lampre-Merida). Apesar da subida ser difícil, o italiano poderá procurar a terceira vitória de etapa e a liderança na classificação dos pontos.

Quanto à subida, serão 4650 metros muito duros: a pendente média é de 10,5%, com a máxima a chegar aos 17%.


Como curiosidade, a primeira vez, das seis, que o Giro terminou em Pinerolo teve o grande Fausto Coppi como vencedor, em 1949.


Giro d'Italia 2016 - Stage 18 por giroditalia

E sexta-feira chega um dos momentos mais aguardados: a subida ao Colle dell’Agnello, o ponto mais alto da Volta a Itália, a 2744 metros. Serão mais de 21 quilómetros a subir e a fase mais difícil terá 9,5% de média e uma pendente máxima de 15%. O vencedor desta etapa ganhará ainda o troféu Vincenzo Torriani, que desde 1996 homenageia o histórico organizador da competição e que é dado na tirada que tem o ponto mais alto do Giro. 



Para terminar os 162 quilómetros, nada melhor que uma primeira categoria. Outro pormenor a ter em atenção será a meteorologia. No Colle dell'Agnello os ciclistas poderão apanhar um inverno rigoroso. Esperemos que não existam nenhumas mudanças de última hora devido ao protocolo de tempo extremo.

Se Kruijswijk sobreviver ao Colle dell'Agnello terá então pela frente uma última etapa, que tem um percurso que a poderá tornar épica: três primeiras categorias (a primeira é logo no início) e uma terceira onde está colocada a meta. 134 quilómetros de longas subidas e de descidas complicadas. Não há um metro plano.

A forma como tem decorrido este Giro, com muita indefinição, etapas espectaculares, com os ciclistas sem medo de atacar... É melhor respirar fundo, pois o final da Volta a Itália ameaça ser memorável.

A 17ª etapa que frustrou Nizzolo

É inevitável pensar-se no que aí vêm e não tanto numa etapa que até teve alguma animação, mas que não provocou alterações na geral. Ainda assim, o final foi emotivo. Parecia que era dia de sprinters, mas primeiro foi Filippo Pozzato a tentar a vitória para a equipa convidada que ainda não ganhou, a Wilier-Southeast. O italiano acabou por admitir que ao fazer a curva para a recta da meta e ao aperceber-se que ainda faltavam 600 metros... perdeu as forças.

Foi nessa altura que Roger Kluge (30 anos) colocou em prática toda a sua experiência de pista. Atacou e no pelotão parecia haver alguma surpresa. Nizzolo foi quem reagiu melhor, mas era tarde de mais. Quanto aos nove segundos lugares na carreira no Giro (sim, nove - Peter Sagan não está sozinho neste historial): "Não podemos fazer mais do que estamos a fazer. O karma está contra mim. Não sei o que fiz mal para acontecer isto. Temos de continuar." Nizzolo e os restantes sprinters têm a última etapa para alcançar a desejada vitória (se conseguirem cumprir o limite de tempo nas montanhas).

Mas é impossível não referir: saiu Marcel Kittel, saiu André Greipel e mesmo assim foi um alemão que ganhou um sprint... Este Giro é para esquecer para a armada italiana dos homens mais rápidos.

Vincenzo Nibali vai ao médico

De salientar ainda que foi confirmado que o ciclista italiano da Astana vai ser submetido a testes médicos para tentar perceber porque não está a conseguir mostrar-se ao seu melhor. O próprio admitiu que se sentiu "vazio" depois de tentar atacar na terça-feira, apesar de estar bem quando começaram as dificuldades. Talvez um vírus esteja a prejudicar Nibali, ou pura e simplesmente não está em forma...



Giro d'Italia 2016 - Stage 17 - Highligths por giroditalia

25 de maio de 2016

Kruijswijk: ataquem que ele aguenta

(Fotografia: giroditalia.it)
Primeiro grande teste à sua liderança, numa terceira semana que não terá um momento de sossego para Steven Kruijswijk. Sem uma equipa forte para o ajudar, a questão seria até quando o holandês aguentaria ataques dos adversários, que já se esperava que viessem de todos os lados. Kruijswijk mostrou como se faz, numa exibição brilhante e que certamente frustrou os seus rivais.

Foi à vez: Nibali, Valverde, Zakarin, Jungels... era vê-los tentar afastarem-se do camisola rosa. E Kruijswijk? Só não se preocupou muito com Bob Jungels (Etixx-QuickStep), porque aos outros, respondeu sempre. Uma, duas, três vezes, este holandês teve um super dia, mesmo tendo em conta que rapidamente ficou sozinho, apesar de um grande esforço de dois colegas. "Hoje [terça-feira] senti-me bem", salientou. E era óbvio que estava a falar a verdade. O ciclista a Lotto-Jumbo acrescentou que não foi assim tão fácil, pois afinal foi muito atacado.

Mas o poderio de Kruijswijk foi ainda um pouco mais longe. Não só aguentou, como até fez um pequenos contra-ataques, mostrando aqui tabém inteligência. Apesar de se sentir bem, ainda faltam pelo menos três etapas complicadas. Há que poupar forças, pois esta foi apenas a primeira amostra do que espera ao ciclista.


(Fotografia: giroditalia.it)
Apesar do trabalho da Astana, Vincenzo Nibali afundou-se e até saiu do pódio. Já Alejandro Valverde deu sinal à sua Movistar que está mesmo recuperado do mau dia que teve no sábado e pronto para ainda tentar discutir o Giro, ou pelo menos, ficar no pódio. E já se sabe que o espanhol também aproveita as oportunidades que lhe surgem para conquistar etapas e nada melhor do que ter já garantido na sua Volta a Itália de estreia uma vitória, batendo o camisola rosa nos últimos metros.

E ficou o aviso: a diferença é grande - 3:23, um pouco menos que à partida com a ajuda das bonificações -, mas Valverde ainda não atirou a toalha ao chão. O alerta é também para Johan Esteban Chaves (Orica-GreenEDGE). Por momentos pareceu que o colombiano seria o derrotado do dia. Porém, acabou por revelar muita frieza, mesmo quando via o grupo de favoritos a afastar-se. Tal como o camisola rosa, Chaves conta com uma ajuda limitada da equipa, mas encontrou o seu ritmo e salvou o segundo lugar, tendo ficado satisfeito com isso mesmo. Mas tem Valverde a 23 segundos.

Outra das figuras do dia foi Zakarin. O russo da Katusha deve estar um pouco frustrado com Kruijswijk. O holandês nunca lhe deu espaço e Zakarin bem atacou. Foi compensado com a subida na classificação e está a 4:50. Não vai certamente desistir de pelo menos chegar ao pódio, mas seria estranho não ver o russo tentar uma vitória de etapa, naquela que é a sua segunda participação numa grande volta. A primeira foi precisamente no Giro há um ano.

A luta pelo top dez também vai ficando definida, com Rigoberto Uran (Cannondale) a comprovar ser uma das desilusões do Giro.


Giro d'Italia 2016 - Stage 16 - Highlights por giroditalia

Confira o resultado da etapa e as classificações.

Etapa 17: Molveno - Cassano D'Adda (196 quilómetros)




Depois de um dia muito rápido, afinal eram "apenas" 132 quilómetros entre Bressasone e Andalo, voltamos às etapas longas. Esta quarta-feira serão 196 quilómetros, os primeiros 120 com sobe e desce, incluindo uma quarta categoria. Mas depois de Brescia é o momento para os sprinters, que tanto sofreram na terça-feira para conseguir entrar dentro do tempo limite, tentarem lutar por uma vitória numa semana de montanhas. Ou então, também é dia para uma fuga triunfar, caso faltem forças às equipas dos poucos sprinters ainda em prova. Trek-Segafredo e Lampre-Merida poderão assumir as despesas do pelotão, para procurar a primeira vitória para Giacomo Nizzolo e Sacha Modolo, respectivamente. No primeiro caso, somar pontos será imperativo, já que Diego Ulissi (Lampre) aproximou-se e agora só está a oito do líder desta classificação.


Giro d'Italia 2016 - Stage 17 por giroditalia

Nem Nibali percebe o que lhe está a acontecer

(Fotografia:giroditalia.it)
Vincenzo Nibali até parece que tenta. Ele bem quer atacar e reagir a ataques, mas algo está a falhar ao italiano e nem o próprio parece conseguir explicar. Perante mais uma etapa em que viu os seus principais rivais - e não só - afastarem-se sem que conseguisse esboçar a mais pequena reacção, Nibali já não pode apenas culpar num dia mau, como o da crono-escalada. Tem estado sempre a perder tempo e a ambicionada vitória no Giro já ganhou contornos de milagre. Em duas etapas passou do segundo lugar a 41 segundos, para o quarto a 4:43. E tem Ilnur Zakarin a sete segundos e Rafal Majka também terá o italiano na sua mira (está a 51 segundos).

"Não sou eu próprio. Parece que estou a sentir-me bem, mas depois descubro que estou vazio. De momento não tenho uma explicação, mas preciso de encontrar as razões para estas performances inconstantes", afirmou um muito desanimado Nibali, depois de uma etapa que terá arrumado com as suas possibilidades de vencer o seu segundo Giro. E é melhor que descubra rapidamente essas razões. É que para reentrar na luta será preciso não apenas um Nibali ao seu melhor, mas quase um super ciclista, pois não se tem de preocupar apenas com o líder Steven Kruijswijk (Lotto-Jumbo). Agora há mais cinco candidatos ao pódio, e Chaves (Orica-GreenEDGE) a Valverde (Movistar) podem não estar num momento idílico, mas estão muito melhor que Nibali. Já nem uma hipotética aliança com Valverde o poderá ajudar, até porque com o espanhol em terceiro, não haverá interesse da parte do ciclista da Movistar.

Recuando ao início da Volta a Itália, Nibali era visto como o regresso do filho pródigo. Um regresso quase forçado depois de um 2015 terrível (esteve mal no Tour e foi expulso da Vuelta), em que se salvou a conquista do monumento da Lombardia. Nibali estava de volta a casa, às origens, para recuperar o prestígio perdido - depois de Fábio Aru ter passado para número 1 na hierarquia da Astana - e também para recuperar a motivação claramente perdida.

Porém, das poucas vezes, antes da chegada da verdadeira montanha, que o italiano teve para se mostrar, foi tímido e pouco convincente. Não está na melhor forma, ou pelo menos, numa forma que se exigia para discutir a competição. A Astana aparece como um bloco protector de qualidade, com Scarponi, Fuglsang e na 16ª etapa Kangert. Ainda assim, não é a Astana de 2015 que ajudou Aru. Falta um Mikel Landa ao italiano, ou seja, um braço-direito. Mas este Nibali está claramente a precisar de mudança. Talvez a sua posição na Astana esteja a afectá-lo mais do que deixa transparecer. Talvez seja mesmo o momento para mudar de ares para o Bahrain, como tanto se fala.

Mas agora faltam-lhe quatro etapas (exclui-se a da consagração no domingo) e o italiano tem de mostrar algo. Dada a ambição de Nibali o pódio não deverá ser suficiente para o satisfazer. Ganhar uma etapa irá tornar-se uma obsessão.